Série: Crescimento dos BRICS - BRASIL
Geografia

Série: Crescimento dos BRICS - BRASIL


Autores: Flávio Vilela Vieira[1]& Michele Polline Veríssimo[2]


Brasil

Entre os países que compõem o BRIC, o Brasil é o que possui as menores taxas de crescimento do PIB observadas ao longo das últimas décadas (média de 1,7% nos nos 1990 e 3,1% entre 2000 e 2005).

A década de 1990, no Brasil, foi marcada pelas reformas liberalizantes ? abertura comercial e financeira, desregulamentação dos mercados, privatizações, redução da atuação do Estado ? e pela estabilização inflacionária alcançada através do Plano Real. Entretanto, para Carneiro (2002) e Sicsú (2007), a política econômica adotada com o Real alijou o crescimento econômico em nome do fortalecimento das instituições nacionais com o propósito de controlar a inflação e atrair investidores internacionais. Mesmo após a eleição do presidente Lula, a condução da política econômica manteve as linhas gerais do governo anterior (FHC), adaptando apenas alguns conceitos, relacionados à área social, aos princípios do Partido dos Trabalhadores.

Carneiro (2002) destaca uma conjugação de fatores internos e externos, que determinaram o baixo dinamismo da economia brasileira no período recente. A estratégia de ?desenvolvimento? do Real foi baseada nos seguintes aspectos: i) a estabilidade de preços estimularia o investimento privado; ii) a abertura comercial, junto com o câmbio sobrevalorizado, disciplinaria os produtores domésticos, conduzindo a ganhos de eficiência; iii) as privatizações e o investimento estrangeiro removeriam gargalos de oferta na indústria e infraestrutura e iv) a liberalização cambial atrairia poupança externa para complementar o investimento doméstico e financiar o déficit em conta corrente.

O autor argumenta que, embora a estabilidade de preços tenha sido alcançada, a abertura comercial causou a deterioração do saldo comercial e o desequilíbrio do balanço de pagamentos, tornando a economia bastante dependente de recursos externos. A política de taxa de juros elevada e a concorrência com os produtos importados ocasionaram a quebra de muitas empresas nacionais e o aumento do nível de desemprego. A liberalização da conta de capital não resolveu o problema do financiamento de longo prazo, uma vez que a maioria dos fluxos de capitais que ingressaram no país, até meados da década de 1990, foi de curto prazo, em busca de ganhos rápidos e elevados. Mesmo após 1995, quando os fluxos de IDE passaram a ingressar mais fortemente na economia, tais fluxos não foram capazes de alavancar o crescimento, pois se dirigiram, principalmente, à compra de empresas privatizadas e, portanto, não
implicaram a criação de riqueza nova (investimento no setor produtivo) para a economia. A ausência de regulação dos fluxos de capitais implicou volatilidade do financiamento, vulnerabilidade da economia aos fluxos de curto prazo e restrições à autonomia da política econômica doméstica.

A mudança do papel do Estado também é relevante para explicar o baixo crescimento econômico brasileiro. Observa-se que o Estado, com a privatização das empresas estatais, deixou de atuar diretamente no desenvolvimento do setor produtivo, na criação de infraestrutura e no financiamento de setores específicos, como o fez no período de maior crescimento da economia (anos 1960 e 1970).

Atualmente, o Estado perdeu sua capacidade de coordenação e de indução do investimento. A preocupação básica passou a ser a redução do déficit público, agravado pelo elevado componente financeiro da dívida, por meio da obtenção de crescentes superávits primários, o que implica cortes de gastos públicos e redução de recursos para os projetos sociais e de investimentos (Carneiro, 2002; Sicsú, 2007).

A partir de 1999, a estratégia brasileira passou a ser fundamentada no tripé metas de inflação, metas fiscais e flexibilidade cambial. O objetivo principal do governo, no entanto, continua sendo a manutenção da estabilidade inflacionária baseada na obtenção de credibilidade e de reputação perante os mercados financeiros domésticos e internacionais (Sicsú, 2007). Para manter a inflação controlada, conforme a meta, as taxas de juros reais brasileiras foram mantidas em patamares elevados, acima dos 10% no período 1999-2005, dificultando a obtenção de crédito e a formação de expectativas de longo prazo pelos empresários, além de aumentar a dívida pública. Quanto ao regime cambial, verifica-se certa volatilidade da taxa de câmbio nominal, que aumenta em períodos de forte pressão cambial, além do fato de que o câmbio real efetivo deprecia ou aprecia em função do movimento dos fluxos cambiais. A partir de meados de 2004, verifica-se uma clara tendência de apreciação cambial (De Paula; Ferrari Filho, 2006).

De Paula e Ferrari Filho (2006) afirmam que, após 2002, o crescimento das exportações líquidas brasileiras implicou uma melhoria significativa dos indicadores de vulnerabilidade externa com a diminuição da relação dívida externa/exportações de 3,5 em 2002 para 2,1 em 2004. Adicionalmente, o peso da dívida de curto prazo no total da dívida externa, a existência de uma conta de capital aberta e as dúvidas quanto à trajetória futura da balança comercial devido à tendência de apreciação do câmbio indicam que o futuro da economia brasileira é ainda preocupante.

Sobre as tendências de crescimento da economia brasileira, Wilson e
Purushothaman (2003) argumentam que o processo de ajustamento da economia durante o Plano Real reduziu a taxa de investimento, o que contribuiu para a depreciação do estoque de capital, principalmente em infraestrutura, com consequências danosas sobre a produtividade da economia. Para quebrar a tendência de baixo crescimento brasileiro, sugere-se aprofundar as reformas estruturais, pois, comparados com a China, a economia é muito menos aberta, as
taxas de investimento e de poupança são muito baixas, e o endividamento interno e externo é substancialmente mais alto.

Sicsú (2007) enfatiza a ausência de mudança dos rumos da política econômica no governo Lula, que se mostra incapaz de criar um programa voltado para o crescimento e geração de empregos, sem perder de vista o objetivo de controle da inflação. O autor acredita que, para estimular o crescimento, o governo deveria criar uma ampla arquitetura que garanta a estabilidade de preços independentemente não só da taxa de juros mas também de uma política industrial de promoção de exportações e substituição de importações e de uma política cambial responsável para restringir transações financeiras especulativas. Tais fatores possibilitariam uma queda da taxa de juros nos próximos anos e uma redução da vulnerabilidade da economia a choques que possam se transformar em crises cambiais.



[1] Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais). Pós-Doutor ? Bolsa Capes (University of Glasgow, UK).

[2] Professora do Instituto de Economia da UFU. Doutoranda em Economia (IE-UFU), Uberlândia, MG, Brasil.




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