Geografia
Série: Crescimento dos BRICS - ÍNDIA
Autores: Flávio Vilela Vieira& Michele Polline Veríssimo
Índia
A economia indiana também vem apresentando, nas últimas décadas,
notável desempenho macroeconômico, caracterizado por elevadas taxas de crescimento do PIB (média de 5,7% nos anos 1990 e de 6,3% entre 2000 e 2005), baixa inflação e crescimento expressivo das exportações de bens e serviços, especialmente de serviços relacionados à tecnologia da informação.
O desempenho econômico indiano encontra-se, por vezes, associado às reformas implementadas na Índia no início da década de 1990, com ênfase na liberalização comercial, na abertura ao investimento direto estrangeiro, na modernização do sistema financeiro e na redução dos monopólios do setor público. Entretanto, DeLong (2003), Rodrik e Subramanian (2004), Kochhar et al. (2006) e Nassif (2006) apontam que a transição para o alto crescimento teria se iniciado já em meados dos anos 1980, uma década antes das medidas de liberalização econômica. Tais autores argumentam que a base do crescimento indiano fundamenta-se no período 1985-1990, no qual, para romper com um cenário protecionista de uma indústria ineficiente e com baixa competitividade no mercado internacional, diversas medidas foram adotadas pelo governo Rajiv Ghandi para estimular as vendas externas: eliminação gradual dos licenciamentos
industriais e das licenças de importação, incentivos às exportações, redução dos direitos de monopólio do governo na importação de itens estratégicos, minirreforma tributária, com dedução ou isenção de impostos sobre o valor adicionado dos insumos produzidos no mercado interno ou importados.
Para Nassif (2006), o desempenho notável da economia indiana pode ser considerado como resultado da combinação de três fatores: i) continuidade das reformas estruturais iniciadas nos anos 1980 para propiciar o aumento da produtividade na economia; ii) política macroeconômica voltada ao crescimento e à geração de empregos; e iii) uma visão estratégica de longo prazo, que mantém o planejamento e a presença do Estado em setores economicamente pouco atrativos à livre iniciativa.
Nesse contexto, o processo de liberalização da economia ganhou continuidade nos anos 1990 através da adoção de medidas como a extinção dos controles de licenciamento industrial; a quase completa eliminação dos licenciamentos para as importações; maxidesvalorização nominal em relação ao dólar e a criação de um mercado dual de câmbio para manter a competitividade externa dos bens e serviços indianos comercializáveis; privatização das empresas
públicas menos relevantes; liberalização do IDE, mas adoção de medidas mais prudentes quanto à eliminação dos entraves à entrada de capitais de curto prazo; reforma do sistema financeiro e do mercado de capitais, com desregulamentação bancária, simplificação dos mecanismos de determinação das taxas de juros domésticas; eliminação de restrições à emissão de ações no mercado primário e permissão (sujeita a restrições) para que investidores institucionais estrangeiros pudessem aplicar em ações de companhias indianas.
O autor, no entanto, destaca que a estratégia indiana para o crescimento envolveu a atuação estatal em questões que abarcam um conjunto de políticas mais amplas, como a industrial, a comercial, a de infraestrutura, a tecnológica, a educacional etc., em uma visão de desenvolvimento de longo prazo, onde o Estado continua atuando em setores estratégicos, notadamente em infraestrutura. Além desses mecanismos de liberalização e de incentivos às vendas externas, Nassif (2006) sugere que a expansão dos déficits fiscais decorrentes das políticas de expansão de gastos públicos pode ter contribuído para elevar as taxas médias de crescimento econômico, porém a geração de déficits fiscais futuros acabou por ter impactos desfavoráveis sobre o crescimento.
Velasco (2005) ressalta o caráter pragmático assumido pelas reformas implementadas na Índia, já que as mesmas foram realizadas de forma gradual, flexível e de acordo com os interesses do país. Apesar de expressiva redução, a Índia mantém altos níveis de proteção tarifária, comparativamente, e as barreiras não tarifárias continuam a valer para a importação de bens de consumo e produtos
agrícolas. Além disso, as reformas indianas destacam-se pelo descompromisso com fórmulas pré-fabricadas ? a Índia não defende a independência do Banco Central; não há eliminação total dos controles de capitais; permanece a forte participação estatal no setor bancário; e, ao invés de grandes programas de privatização, o Estado procurou reestruturar o setor produtivo estatal mediante uma política cautelosa de desinvestimento (venda de participações, sem transferência de controle sobre as empresas).
Bosworth et al. (2007) destacam que o desempenho da economia indiana, de maneira distinta em relação à economia chinesa, se fundamenta na rápida expansão do setor de serviços. A participação desse setor na composição do valor adicionado total avançou consideravelmente nas últimas décadas, representando 58% do PIB em 2003. Esse fato contribuiu para a expansão do setor de serviços,
especialmente de tecnologia de informação, e para uma política industrial destinada a fomentar a eficiência por meio da liberalização das importações de equipamentos.
Sobre a taxa de acumulação de capital fixo, os autores indicam uma tendência de crescimento da taxa de investimento (17% do PIB entre 1999-2004), sendo que a taxa de poupança requerida para financiar o investimento na economia também tem aumentado rapidamente. Destaca-se que a economia indiana vem tentando capturar poupança externa, através do IDE, mas o país tem recebido muito pouco dos fluxos de IDE direcionados para os países emergentes. Quanto à formação de capital humano, verifica-se que a Índia ainda enfrenta sérios desafios no sistema educacional, principalmente no que diz respeito à educação primária.
As taxas de analfabetismo no país permanecem bastante elevadas (40%), com porcentagem de trabalhadores com educação secundária e nível superior igual a 14% e 6%, respectivamente, em 2004.
De Paula e Ferrari Filho (2006) destacam o aumento do fluxo de IDE para a Índia após os anos 1990, embora este ainda permaneça relativamente baixo. As regulamentações sobre os fluxos de capitais de longo prazo têm sido afrouxadas, incluindo os limites de propriedade acionária no IDE e os limites para captação de empréstimo externo pelas firmas domésticas. As restrições sobre capitais de curto prazo continuam, no entanto, significativas, predominando controles quantitativos e sobre a saída de capital.
Finalizando, Nassif (2006) observa que não há evidências precisas de que o atual processo de crescimento da economia indiana será sustentável no longo prazo. Dependerá, sobretudo, da capacidade do setor de serviços e industrial de produzir maiores efeitos de encadeamento entre si e com a agricultura, que ainda absorve cerca de 60% da força de trabalho, de forma que venham a aumentar o potencial de absorção da força de trabalho excedente no país.
Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais). Pós-Doutor ? Bolsa Capes (University of Glasgow, UK).
Professora do Instituto de Economia da UFU. Doutoranda em Economia (IE-UFU), Uberlândia, MG, Brasil.
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