Por pouco, não houve outro Massacre de Eldorado
Geografia

Por pouco, não houve outro Massacre de Eldorado



Por Leonardo Sakamoto

Quase ocorreu uma tragédia na “Curva do S”, local onde 19 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados em 17 de abril de 1996 – no que ficou conhecido como o Massacre de Eldorado dos Carajás. Na tarde da última sexta-feira, policiais ameaçaram ir para cima de mais de mil trabalhadores ligados ao MST durante uma manifestação pacífica no local. Faltou pouco, muito pouco, o que me leva a crer que a polícia do Pará realmente tem sede de sangue.
À frente, o delegado Raimundo Benassuly, que ficou conhecido nacionalmente por tentar justificar que uma adolescente de 15 anos colocada em uma cela cheia de presos no Pará era a culpada pelo episódio. Segundo ele, a menina “certamente tem alguma debilidade mental porque em nenhum momento informou ser menor de idade”. Foi afastado, mas depois voltou ao cargo. Básico.
Há 13 anos, o massacre ocorreu por conta da ação violenta da polícia militar para desbloquear a PA-150, no Sudeste do Pará. A rodovia estava ocupada por uma marcha do MST que se dirigia à Marabá para exigir a desapropriação de uma fazenda, área improdutiva que hoje abriga um assentamento.
Há uma relação carnal que se estabelece entre o patrimônio público e a propriedade privada na região amazônica. Muito similar ao que se enraizou com o coronelismo nordestino da Primeira República, o detentor da terra exerce o poder político, através de influência econômica e da coerção física. O já tênue limite entre as duas esferas se rompe. É freqüente, por exemplo, encontrar policiais que fazem bicos como jagunços de fazendas. O Massacre de Eldorado dos Carajás é um dos tristes episódios brasileiros em que o Estado usou de sua força contra os trabalhadores e a favor dos grandes proprietários de terra. Mas apenas mais um, entre tantos que passam despercebidos na mídia e na opinião pública.
Como disse Marx, “a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Depois dizem que ele está ultrapassado…
Segue trechos da nota da Comissão Pastoral da Terra que relata os momentos de tensão:
“No início da manhã, os trabalhadores interditaram a Rodovia PA 150 como forma de pressão para exigir a abertura de negociação por parte do governo do Estado. Por volta das 11 horas da manhã, sem que a polícia estivesse no local, os trabalhadores decidiram por si mesmos desinterditar a estrada. A situação permaneceu totalmente tranqüila, com o tráfego de veículos restabelecido até por volta das 14 horas, quando chegaram ao local o Delegado Geral de Polícia Civil, Raimundo Benassuly, e o coronel Leitão da Polícia Militar acompanhados de aproximadamente 70 policiais do batalhão de choque.
Demonstrando total despreparo e usando de truculência desmedida, sem dar chance para qualquer tipo de diálogo, o coronel e o delegado partiram para cima dos trabalhadores que se aglomeraram nas imediações da pista, gritando de forma descontrolada que estavam ali para prender quem estivesse à frente. O Delegado Geral, Raimundo Benassuly, sacou uma pistola e ameaçou atirar nos trabalhadores que se aproximavam. Vendo a ação do delegado, outros policiais fizeram o mesmo, e, em seguida prenderam três trabalhadores sem qualquer motivo.
O advogado da CPT de Marabá, José Batista Gonçalves Afonso e os Defensores Públicos Rossivagner e Arclébio, que se encontravam no local desde o período da manhã, ainda tentaram acalmar a fúria do Delegado e do Coronel, no entanto, foram empurrados e ameaçados de prisão. As centenas de trabalhadores que, em sua maioria, portavam pedaços de paus e facões, só recuaram mediante aos insistentes pedidos do Advogado da CPT. Enquanto os trabalhadores eram acalmados pelo advogado da CPT e pelos Defensores Públicos, o Coronel e o Delegado continuavam provocando o conflito afirmando que não temiam o confronto e nem se importavam com o fato político que pudesse gerar ali. Que vieram para desobstruir a estrada de qualquer jeito, sendo que, a estrada já estava liberada muito antes de eles chegarem.
A ação desmedida do Coronel, do Delegado e também da Governadora contra o MST se deu devido à destruição, no meio da semana, de casas da fazenda Maria Bonita de propriedade do banqueiro Daniel Dantas. O governo do Estado e os fazendeiros acusam o MST por este fato e há, inclusive, um pedido de prisão preventiva contra Charles Trocate, líder do MST, que nem se encontrava no Estado do Pará quando o fato aconteceu.
De janeiro a outubro do ano corrente, segurança e pistoleiros das fazendas do banqueiro já assassinaram um trabalhador sem terra e balearam gravemente outros 17 sem terra no interior das propriedades. Todos os crimes continuam impunes. Nos dois anos e 10 meses de governo de Ana Júlia, apenas no sul e sudeste do Estado, foram 66 fazendas ocupadas por 10.599 famílias; 101 trabalhadores e lideranças foram ameaçados de morte; 23 trabalhadores foram feridos a bala por pistoleiros e seguranças de fazendas; 17 trabalhadores foram assassinados na luta pela terra e 128 foram presos.

Os conflitos agrários no Estado do Pará são problemas sociais da maior gravidade que a governadora, a exemplo de seus antecessores, insiste em resolver com casos de polícia. Enquanto isso, pistoleiros e mandantes dos crimes gozam de total impunidade.”

Fonte: http://colunistas.ig.com.br/sakamoto/2009/11/09/por-pouco-nao-houve-outro-massacre-de-eldorado/


Leia sobre o Massacre Eldorados dos Carajas:

O Massacre – Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade

O fim da farsa

Massacre de Eldorado de Carajás completa 13 anos sem desfecho





- A Justiça Tarda Mas Não Falha: Enfim Os Mandantes Do Massacre De Eudorado Dos Carajás Vão Presos.
Recentemente, foi publicado neste Blog (leia AQUI) onde diz que o "MST lembra Eldorado dos Carajás e realiza manifestações em 21 Estados".  Mas parece que, aquele ditado que diz, a Justiça tarda mas não falha,...

- Após 15 Anos, Dois únicos Condenados Pelo Massacre De Eldorado Dos Carajás Continuam Soltos
O massacre de Eldorado dos Carajás relembrado em 50 fotos; clique e veja Por Guilherme Balza - UOL Notícias Um dos fatos mais trágicos da história brasileira pós-ditadura militar, o massacre de Eldorado dos Carajás, completa 15 anos neste domingo...

- Nota: Milícia Armada De Ex-deputado Federal Assassina Militante Do Mst No Pará
Ação de Milícia armada do fazendeiro e ex-Deputado Federal Josué Bengstson (PTB) que renunciou ao mandato para fugir da cassação por envolvimento na Máfia das Sanguessugas resultaram na morte do trabalhador rural e militante do MST José Valmeristo...

- Vizinhos Do Massacre Dos Carajás Lutam Para Não Repetir A Mesma História
Na fazenda Rio Vermelho, 167 pessoas foram libertadas da escravidão (Foto: Leonardo Sakamoto) Por Iberê Thenório e Joana Moncau Sem-terras acampados a 140 km do local onde ocorreu a chacina lutam contra a grilagem de terras e a lentidão do Incra;...

- Monumento Aos 19 Trabalhadores Rurais Sem-terra Mortos Após Confronto Com A Polícia Militar
Por conta do massacre de Eldorado dos Carajás, abril foi escolhido como o mês em que o MST realiza uma série de atos pela reforma agrária em todo o país. Neste ano, de acordo com a assessoria do movimento, houve manifestações em 14 estados. Nesta...



Geografia








.