O ambientalismo dos geógrafos é demagogia esquerdista
Geografia

O ambientalismo dos geógrafos é demagogia esquerdista


Um dos mantras que não param de ser repetidos pelos intelectuais e professores brasileiros é o de que o capitalismo é, em si mesmo, antiecológico. Na geografia, vemos isso nos escritos de Ana Fani Alessandri Carlos, Marcelo Lopes de Souza, José W. Vesentini, e de tantos outros autores. Ideia sempre repetida com a ligeireza de quem pensa estar enunciando uma verdade tão evidente que não precisa ser comprovada. 


Mas o problema é que, no contexto de fracasso do socialismo, tal afirmação não passa de demagogia barata. Realmente, um dos estratagemas retóricos mais usados pelos intelectuais de esquerda consiste em ignorar o vazio de propostas da teoria social crítica para tornar possível um ataque permanente à sociedade capitalista. Nesse caso, o que se faz é estabelecer relações de causalidade muito vagas entre os problemas ambientais e a "lógica do capitalismo". 

Ora, mas se há problemas ambientais e incertezas muito sérias no mundo capitalista, isso não se deve à suposta contraditoriedade desse sistema e nem às desigualdades sociais, mas simplesmente ao fato de que o capitalismo levou o desenvolvimento das forças produtivas a níveis sem precedentes. Qualquer civilização que amplie a produção de riquezas exponencialmente produzirá impactos ambientais em escala crescente e pressionará sua base de recursos naturais de forma intensiva. No caso da sociedade capitalista, cuja economia é mundializada desde a origem, essa base de recursos é também mundial. 

Em vista disso, é preciso indagar: uma sociedade socialista deve ser aquela na qual todos têm igualmente acesso a um nível elevado de consumo ou uma sociedade igualitária em que os indivíduos encontram formas de realização pessoal que prescindem do consumo de muitos bens e serviços e, portanto, de grandes volumes de recursos? Se essa última alternativa for correta, impõem-se a questão de explicar qual é, afinal, o padrão de consumo que se deve considerar adequado para uma vida digna numa sociedade socialista. Mas existe algum critério objetivo para determinar isso? E qual é o estatuto teórico que garante que uma sociedade na qual inexistam o mercado e a propriedade privada estaria apta a encontrar um equilíbrio adequado entre produção de riqueza e conservação dos recursos naturais? Os elevados níveis de poluição e os desastres ambientais sem precedentes ocorridos no socialismo real desautorizam qualquer suposição de que haja uma relação necessária entre socialismo (seja lá o que isso for) e sustentabilidade ambiental. 

De outro lado, se uma sociedade socialista decidir gerar riqueza em volume suficiente para garantir a todas as pessoas conforto material em troca de poucas horas de trabalho diário, o resultado poderá ser uma grande crise ambiental, mesmo inexistindo acumulação capitalista ou desigualdades sociais. Nesse sentido, vale lembrar que Boaventura de Souza Santos (2007) ? muito citado por geógrafos, por sinal ? afirma que o socialismo deve rivalizar com o capitalismo na geração de riqueza e ao mesmo tempo superá-lo no "respeito à natureza e na justiça distributiva". Isso implica o reconhecimento de que o "socialismo do século 21", assim como o do século passado, terá necessariamente que explorar os recursos naturais do planeta muito intensamente para gerar um grande volume de riqueza materializado em bens de consumo privado e coletivo. Mas, nesse caso, fica claro que a construção do desenvolvimento sustentável é um desafio e uma incógnita para os projetos socialistas tanto quanto para o capitalismo. 

As críticas de autores como Ana F. A. Carlos (2007) aos estudos científicos e propostas de planejamento baseadas nos conceitos de ecossistema e de desenvolvimento sustentável não passam de demagogia barata, portanto, pois estudos como esses são necessários para qualquer sociedade tecnologicamente complexa e materialmente desenvolvida. Mas chamar o capitalismo de "antiecológico" é outra mentira aceita pelos geógrafos como se fosse verdade evidente por si mesma. Então, todo mundo repete. 

- - - - - - - - - - 

CARLOS, A. F. A. A ?geografia crítica? e a crítica da geografia. In: COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, 9., 2007. Disponível em: <http://www.ub.es/geocrit/9porto/anafani.htm> Acesso em: 18 ago. 2007. 

SANTOS, B. S. Socialismo do século 21. Folha de São Paulo, 07 de junho de 2007. 




- Slavoj Zizek é O Socialista Que Resume Os Outros Socialistas
O filósofo esloveno Slavoj Zizek é uma autêntica celebridade acadêmica internacional. Se me perguntarem a razão de tamanho sucesso, eu diria que está no fato de ele resumir, levando ao paroxismo, todas as características comuns à grande maioria...

- Até Fani Entreviu O Que Ruy Moreira Não Enxergou
Em um texto que fazia o balanço de dez anos do advento da geografia crítica ou radical, Ruy Moreira (um dos muitos geógrafos marxistas que hoje renegam esse rótulo, mas sem abandonar o anticapitalismo velho de guerra) faz uma avaliação muito interessante...

- Desenvolvimento Desigual E Combinado, Mas Não Como Os Marxistas Pensam
Um dos procedimentos retóricos mais usados pelos autores anticapitalistas é sacar do bolso uma longa lista de mazelas econômicas, sociais, políticas e militares e qualificá-las todas como produtos do capitalismo, sem levar em conta as reinvenções...

- As Muitas Formas Do Capitalismo (concluindo Minha Resposta)
Concluo neste post a resposta que escrevi ao comentário enviado por Angelo Menegatti a este blog (ver aqui). Vou me concentrar na passagem em que ele afirma que ser velho é defender o capitalismo, já que as ideias que sustentam tal sistema "são as...

- A Crítica Das Esquerdas Ao Consumismo Também é Demagogia
Uma das ideias mais empregadas para culpar o capitalismo pela dita "crise ambiental" é que as grandes empresas estimulam o consumismo, ideologia que obriga ao uso de quantidades crescentes de recursos naturais para a produção de coisas desnecessárias....



Geografia








.