Geografia
Jorge Amado foi jornalista mercenário do nazismo
De Jorge Amado, já li Capitães de Areia e São Jorge dos Ilhéus. Honestamente, nunca entendi a razão de esse autor ter feito tanto nome na literatura. Compreendo que ele fosse bom vendedor de livros, pois escrevia de modo convencional e punha boas doses de sensualidade e de cor regional em seus romances, o que cai bem no gosto popular. Mas, francamente, esses dois livros que li tinham todas as características que uma obra literária mais ambiciosa jamais deveria ter: mensagem óbvia, panfletarismo político, maniqueísmo, via única de interpretação do contexto histórico e das ações dos personagens, didatismo, personagens com psicologia rasa e construída para reforçar a mensagem, metáforas óbvias e até bregas, e por aí vai.
Por certo, uma das razões para esses elogios desproporcionais à sua obra está no alinhamento político de esquerda, manifesto na panfletagem didática pró PCB que é São Jorge dos Ilhéus, por exemplo. Se ele escrevesse em defesa de ideias e valores de direita ou simplesmente não tratasse de política em seus livros, teria sido muitíssimo menos poupado pela patrulha politicamente correta. Afinal, ninguém fez mais divulgação do estereótipo da mulher latina morena e sensual no exterior do que Jorge Amado, mas as críticas que recebeu por isso não são nem a sombra do que seria de esperar. Prova disso é que, enquanto Gilberto Freyre vem há décadas sendo acusado de propalar o mito da democracia racial por seu elogio da miscigenação como traço cultural do brasileiro, Jorge Amado, que expressou basicamente a mesma ideia na literatura, não recebe nem um décimo desse fel.
Ao mesmo tempo, o alinhamento político de suas obras lhe rendeu uma imagem de idealista, que ele soube cultivar muito bem. Tanto é assim que, no livro 501 Grandes escritores, lemos a seguinte citação de Amado, em destaque:
Eu acredito em mudar o mundo e que a literatura tem uma imensa importância (citado por Doubt, 2009, p. 415).
Acreditava mesmo, é? Bem, então foi com vistas a mudar o mundo que ele se tornou redator do jornal Meio-Dia, veículo de propaganda nazista no Brasil? Foi com essa nobreza de propósitos que ele fez propaganda do nazismo, em 1940? O jornalista Leandro Narloch sugere que os objetivos dele deviam ser muito prosaicos, na verdade:
Não que o escritor se identificasse com a doutrina de Hitler - a questão provavelmente era financeira. Jorge Amado devia escrever o que lhe pagassem, fosse comunista, nazista ou americano. Durante o emprego no jornal dos alemães, tentou convencer colegas para que trabalhassem para Hitler (Narloch, 2009, p. 109).
De fato, Oswald de Andrade conta em Os dentes do dragão que Jorge Amado o incentivou a aceitar a proposta de "um alemão altamente situado na embaixada" para escrever um livro em apoio ao nazismo, e lhe informou que os rendimentos com o livro poderiam chegar a 30 contos de Réis. E ainda complementa que, quando recusou a oferta, Amado ficou surpreso e lhe disse que já havia feito vários trabalhos de encomenda para o mesmo sujeito (citado por Narloch, 2009, p. 110).
Essa passagem do livro de Leandro Narloch me deu uma ótima pista para entender algo que sempre achei muito estranho: por que um simpatizante histórico do comunismo, que chegou a escrever obras panfletárias em louvor de um assassino como Luís Carlos Prestes e do genocida Josef Stálin, fazia tantos elogios a Antonio Carlos Magalhães, o mais importante prócer da ditadura militar na Bahia? Eu me lembro que, na época, isso me parecia algo absolutamente fora do lugar, por motivos óbvios. Mas as razões apontadas acima para o apoio desse escritor ao nazismo permitem levantar a hipótese de que talvez os seus elogios rasgados a ACM tivessem origem em algum interesse econômico ou de outro tipo. Ainda assim, parece não haver evidência de que Amado tenha recebido algum benefício monetário ou de qualquer espécie por conta desse apoio.
Seja qual for a resposta, uma coisa é certa: um autor não comunista que tivesse dado apoio por escrito ao nazismo na juventude, passado boa parte de sua vida literária divulgando clichês que hoje são tidos como preconceituosos e, já na maturidade, escrevesse em favor de um político reacionário feito o ACM, seria execrado e crucificado por toda a intelectualidade brasileira, que jogaria seus livros no lixo mesmo que eles tivessem um grande valor literário. Mas, como nossos intelectuais adoram o comunismo e pouco se incomodam com as dezenas de milhões de mortos produzidos por gente como Stálin, vemos aí esse escritor medíocre sendo lembrado e homenageado como se tivesse muito talento, idealismo e espírito humanista!
Se o Brasil não fosse um país dominado por um esquerdismo doente, Jorge Amado levaria tomatadas, isso sim!
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DOUBT, J. Jorge Amado. In: PATRICK, J. (org.). 501 grandes escritores. Rio de Janeiro: Sextante, 2009.
NARLOCH, L. Guia politicamente incorreto da história do Brasil. São Paulo: Leya, 2009.
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