Cultura estatista é fator de atraso para o Brasil
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Cultura estatista é fator de atraso para o Brasil


O livro O mistério do capital, de Hernando De Soto (2001), é leitura obrigatória para qualquer um que quiser conhecer uma explicação científica para as diferenças de desenvolvimento entre países alternativa às teorias e ideologias imperialistas que infestam a política latino-americana. Esse autor afirma, com base numa extensa pesquisa histórica, que a chave do desenvolvimento está em um país consolidar as instituições que são fundamentais para estimular indivíduos e empresas a investir capital, sendo a mais importante dessas instituições o direito de propriedade. É necessário haver um sistema integrado formal de representação da propriedade, ou seja, um conjunto padronizado de leis e instituições que asseguram o direito de propriedade e que tornam os possuidores de imóveis urbanos e rurais responsáveis pelo uso que dão a esses bens. Adicionalmente, é preciso que as leis que regulamentam a operação de empresas privadas sejam simples e que os procedimentos burocráticos envolvidos na abertura e fechamento de empresas, no pagamento de impostos, na obtenção de alvarás de funcionamento, entre outros, sejam ágeis e baratos.


Em função disso, De Soto afirma e repete diversas vezes que a explicação do subdesenvolvimento não está na cultura, mas sim nesse problema institucional. Os países atualmente desenvolvidos, até uns 150 anos atrás, padeciam dos mesmos problemas que hoje afetam os países pobres: o sistema de leis protegia a propriedade e os negócios de uma minoria que integrava a economia formal, deixando a maior parte da população na informalidade, sem ter seu direito de propriedade e seus pequenos negócios reconhecidos legalmente. Foi à medida que os EUA e Europa Ocidental constituíram sistemas institucionais adequados à dinâmica real da economia - algo que, no Japão, se deu após a Segunda Guerra -, que esses países lograram alcançar o nível de desenvolvimento econômico e de bem-estar social que vemos hoje. Em suma, o problema não é cultural, mas institucional.

Um porém

Acho a explicação de Hernado De Soto para o subdesenvolvimento muito convincente, mas creio que existe uma pergunta não respondida aí, que é a seguinte: por que os países pobres da América Latina, África e Ásia permanecem tão atrasados em constituir sistemas institucionais capazes de incluir a todos na dinâmica da acumulação de capital? Qual é a razão para uma demora tão grande em legalizar as propriedades das pessoas pobres e em facilitar os processos de criação e de funcionamento de novos negócios? Honestamente, não vejo outro caminho para explicar esse atraso senão na presença de concepções fortemente estatistas e anti-mercado na cultura dos países subdesenvolvidos, as quais são responsáveis pela existência de aparelhos estatais hipertrofiados, dirigistas, que sufocam a atividade empresarial com pesadas taxações e burocracia infernal. Além disso, é bom levar em conta que essas visões estatistas criam entraves para o desenvolvimento não apenas na esfera institucional, mas também no dia a dia da condução das políticas macroeconômica, fiscal, de comércio exterior, e assim por diante.

Um bom exemplo da influência dessas visões, que tanto podem assumir a forma de ideologias socialistas como também de diversos nacionalismos, à esquerda e à direita, pode ser encontrado em nosso sistema de ensino, conforme pode ser pesquisado neste blog. Mas há dois livros que abordam, entre muitos outros, o seguinte problema crucial no Brasil e na América Latina: o "viés anti-capitalista". Esses livros são Brasil: raízes do atraso, de Fabio Giambiagi (2007), e Complacência, do mesmo Giambiagi em parceria com Alexandre Schwartsman (2014). Neles, o foco não está nas  instituições, mas numa série de políticas que, pautadas por visões estatistas e hostis ao investimento privado e à liberdade econômica, respondem pelo baixo crescimento exibido pela economia brasileira nas últimas décadas. Recomendo fortemente a leitura desses livros, e vou escrever uma resenha sobre o segundo numa futura postagem. 

Por hora, deixo o seguinte recado: não devemos ceder à patrulha e aos truques retóricos do politicamente correto; visões estatistas impregnadas na cultura de certos povos podem ser sérios obstáculos ao desenvolvimento e ao bem-estar social, sim. Afinal, os valores que sustentam a democracia e a economia de mercado não têm nada a ver com gostos musicais, culinária, hábitos, indumentária, festas de rua, e assim por diante. Criticar os elementos culturais que prejudicam as instituições e a condução das políticas públicas nada tem a ver com eurocentrismo ou qualquer coisa que o valha.

Postagens relacionadas

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DE SOTO, H. O mistério do capital. Rio de Janeiro: Record, 2001.

GIAMBIAGI, F. Brasil: raízes do atraso; paternalismo versus produtividade. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

GIAMBIAGI, F.; SCHWARTSMAN, A. Complacência. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.




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