Os ?milagres econômicos? da Guerra Fria
Geografia

Os ?milagres econômicos? da Guerra Fria


Correio da Cidadania
 
29/12/2012   

Os ?milagres econômicos? da Guerra Fria


José Luis Fiori - do Rio de Janeiro

Guerra Fria
A lógica da Guerra Fria pesou decisivamente na origem dos ?milagres econômicos? na Alemanha, Japão, Itália e Coreia, e na transformação posterior desses países em peças centrais da engrenagem econômica do poder global dos Estados Unidos, pelo menos até a década de 70

Agora bem, a despeito de suas grandes diferenças históricas e políticas, Alemanha, Japão, Itália e Coréia foram derrotados e destruídos ? na II Guerra Mundial ou na Guerra da Coréia ? e depois foram ocupados e transformados em ?protetorados militares? dos EUA. Logo depois da guerra, a ideia americana era desmontar as antigas estruturas econômicas destes países. Mas depois do começo da Guerra Fria e do fim da Guerra da Coréia, este projeto inicial foi substituído por uma política diametralmente oposta de estimulo ao crescimento econômico, com forte dos governos locais, e dos próprios agentes econômicos e instituições privadas do pré-guerra. Por isto, se pode dizer com toda certeza que a lógica da Guerra Fria pesou decisivamente na origem dos ?milagres econômicos?, e na transformação posterior daqueles países, em peças centrais da engrenagem econômica do poder global dos Estados Unidos, pelo menos até a década de 70.

No caso do Brasil ? que foi aliado dos EUA na II Guerra ? o caminho foi diferente, mas também se pode falar de um ?convite? que foi aceito ? depois do Acordo Militar Brasil-EUA, de 1952 ? e que transformou o Brasil no pivot central da estratégia desenvolvimentista norte- americana, para a América Sul. A nova política foi experimentada primeiro com o governo JK ? inteiramente alinhado com os EUA e com o colonialismo europeu ? e só depois, a partir de 1964, sob comando direto do regime militar.

Depois de quase três décadas de ?milagre econômico?, entretanto, este processo foi interrompido pela ?crise americana? da década de 70, e pela nova mudança da política internacional dos EUA. Tudo começou com a reaproximação da China, no início da década de 70, que levou à derrota/saída americana do Vietnã, e ao redesenho do equilíbrio do poder, no sudeste asiático. Foi neste mesmo contexto que os EUA decidiram abandonar Bretton Woods, liberando sua moeda e iniciando a desregulação do seu mercado financeiro, com a lenta construção de um novo sistema monetário internacional, baseado no dólar, mas sem base metálica.

A nova estratégia permitiu o cerco e desconstrução final da URSS e o fim da Guerra Fria, mas ao mesmo tempo, ela desativou ou esvaziou o papel econômico que fora ocupado pela Alemanha e pelo Japão, e secundariamente, pelo Brasil, durante as primeiras décadas da Guerra Fria. O crescimento econômico médio anual da Alemanha caiu para 2,10%, entre 1973 e 1990; o do Japão, caiu para 2,97%; o da Itália, para 1,76; o da Coréia, para 6,77; enquanto o Brasil entrava num longo período de estagnação. No mesmo tempo em que a China se transformou no novo milagre econômico? do sistema capitalista mundial, enquanto a Alemanha e o Japão seguiam na sua condição de gigantes industriais e tecnológicos, mas com ?pés de barro?, ainda na condição de protetorados militares dos EUA e sem dispor de recursos naturais essenciais, além de serem igualmente dependentes do ponto de vista alimentar e energético.

Assim mesmo, no início da segunda década do século XXI, pode ser que o Japão e a Alemanha venham a ser resgatados, uma vez mais, como caminho de saída da crise, para os EUA, e como instrumentos da nova doutrina Obama, que se propõe fazer ? desta vez ? o cerco econômico e militar da China. O Japão e a Coréia estão sendo pressionados para participar da Trans-Pacific Partenership ? TPP, que é hoje a pedra angular da política comercial de Obama, e que se propõe reunir dos dois lados do Pacífico, numa grande zona de livre comércio.

Ao mesmo tempo em que a Alemanha vem sendo estimulada a liderar um grande pacto comercial transatlântico, entre a UE e os EUA, e há quem proponha que o Brasil se junte à ?aliança do pacífico?. Neste novo xadrez, entretanto, o Brasil é muito menos desenvolvido que a Alemanha e o Japão, mas dispõe de recursos naturais e é auto-suficiente, do ponto de vista alimentar e energético. Por isto, talvez, só o Brasil tenha hoje condições reais de escolher um caminho que lhe dê maior grau de autonomia estratégica, e maior capacidade de projetar seus interesses e sua influencia, numa escala global.

 
José Luis Fiori é professor titular de Economia Política Internacional da UFRJ e coordenador do Grupo de Pesquisa do CNPQ/UFRJ ?O Poder Global e a Geopolítica do Capitalismo?. (www.poderglobal.net).



http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/os-milagres-economicos-da-guerra-fria/564162/ 
 
 














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