Maracanã, a minha segunda casa ? Parte I
Geografia

Maracanã, a minha segunda casa ? Parte I


Vista aérea do Maracanã. Ao fundo, mais à esquerda, o bairro da Tijuca

É verdade que tenho andado meio saudosista e constantemente ando remexendo no baú da memória em busca de histórias passadas. Coisas da idade.

Talvez seja exatamente por isso que há tempos venho pensando em falar sobre o estádio do Maracanã e sua importância em minha vida, mas, no final, sempre acabava adiando porque achava que o texto poderia desandar para um sentimentalismo exagerado e talvez meio incompreensível para quem não teve a honrar de sentar em suas cadeiras ou em seus assentos de concreto, posteriormente substituídos pelos de plástico (naquela época era costume se assistir aos jogos sentado, ao contrário de hoje), ou mesmo ficar na ponta dos pés na geral - local mais popular e democrático, onde o ingresso era mais barato -, tendo que esticar o pescoço para tentar acompanhar melhor a um lance qualquer.


Mas e daí se o que eu escrevesse tivesse um tom muito pessoal? Se tratando de Maracanã, qualquer experiência, por mais íntima que seja, certamente foi dividida com outras milhares de pessoas.

Falar sobre o estádio Mário Filho, outrora chamado de estádio Municipal, exige uma certa reverência. Não dá para falar à toa sobre o templo sagrado do futebol. Chamá-lo de Maraca, francamente, é sinal de uma intimidade forçada, que ele só permite em ocasiões esporádicas, quando deseja ter o seu ego inflado e o seu nome ovacionado, carinhosa mas fervorosamente, por seus visitantes.

Tenho mesmo uma profunda e íntima relação com o maior do mundo. Muito mais do que a praia ou outras coisas do Rio, é o Maracanã que tem um lugar cativo no meu coração.


É claro que não sou do tempo em que lá existia o Derby Club, da mesma forma que não me recordo da existência da antiga favela do Esqueleto, que deu lugar à atual UERJ, vizinha do estádio. Também não presenciei a transformação daquela região, mas desde moleque frequento suas arquibancadas e demais dependências.

Derby Club do Rio de Janeiro, que deu lugar ao estádio do Maracanã

Antiga favela do Esqueleto, removida para a instalação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), localizada ao lado do estádio Célio de Barros, de atletismo

Algumas vezes cheguei a pisar no gramado e, certa vez, recolhi um tufo de grama que infelizmente se perdeu com o tempo.

E por falar em lembranças, os gostos e cheiros do Maracanã são inconfundíveis. O cachorro quente Geneal (com e mesmo) e um leite achocolatado que vinha numa embalagem em formato de pirâmide são inesquecíveis. Até mesmo os picolés da Kibon pareciam que tinham um gosto diferente quando saboreados no Maracanã.


Muitas vezes íamos caminhando para o estádio e chegava a ser curioso perceber que, assim como acontece com a torcida do Flamengo, os tijucanos também se achavam meio donos do estádio.

Influenciado por uma cesta fantástica de Marcel, no Mundial de 1978, fiz escolinha de basquete naquela quadra de aquecimento que fica bem ao lado do Maracanãzinho e, acompanhado pelos demais colegas, costumávamos perambular pelo seu interior e arredores.

Garoto ainda, aprendi com o meu pai que era bem melhor dar uns passos a mais e subir de forma mais tranquila, longe da muvuca, pela rampa que saía lá em cima, na parte mais elevada da arquibancada, coisa que continuei a fazer até a sua desativação e a construção de camarotes.


Costumávamos nos sentar bem na direção do córner (agora se fala escanteio), bem lá no alto, perto do bar, de onde se tinha uma visão privilegiada do campo. Apesar disso, é engraçado que uma das primeiras imagens que vem à minha mente como recordação foi a de um jogo à noite, que não me recordo qual, em que fiquei pasmo ao entrar pelo túnel inferior, primeiro em dar de cara com os refletores acesos e, depois, ver aquela imensidão verde e toda aquela estrutura de concreto.



Acho que foi a mesma impressão que teve um amigo espanhol louco por futebol e que queria conhecer o principal palco do futebol mundial de qualquer jeito. Quando o viu por fora ficou meio decepcionado, mas depois que pegamos o elevador e a porta se abriu lá no quinto andar, o cara fez uma exclamação de estupefato e se rendeu de vez a seus encantos.




Muito se fala que o brasileiro não tem memória e que não costuma valorizar sua história. Pois bem, quando começaram a falar em sua demolição para que um novo e moderno estádio fosse construído para a Copa de 2014, eu fui um dos que gritou que o que devia ser feito era uma reforma, desde que se preservasse a sua essência e principais características.



Maracanã lotado e inacabado no dia de sua inauguração, realizada em 16 de junho de 1950, numa partida disputada entre cariocas e paulistas

Símbolo de uma cidade, de um país e de todo um povo, o Maracanã ultrapassa os limites do esporte e seria mesmo uma profanação por abaixo um lugar que faz parte da história de tanta gente.


Continua no próximo capítulo.




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