Aqui, jogar tomates é debater ideias
Geografia

Aqui, jogar tomates é debater ideias


Li um texto muito bom do geógrafo Anselmo Heidrich intitulado A noite escura da amoralidade. Depois de uma digressão inicial sobre a questão da criminalidade (retomada mais ao final do artigo), ele faz uma crítica pertinente a Olavo de Carvalho. Conforme citado no texto, Carvalho afirma o seguinte:
[...] o que está em jogo não é realmente nenhuma "luta de ideias" e sim uma luta pela conquista dos meios materiais e sociais de difundir ideias ? coisa totalmente diversa. Você pode provar mil vezes que tem a ideia certa, mas, se o sujeito que tem a ideia errada é o dono das universidades, da mídia e do movimento editorial, o que vai continuar prevalecendo é a ideia errada. [...] A luta pela ocupação de espaços pode comportar uma parte de debate político-ideológico, mas tem de ser uma parte bem modesta. O essencial não é vencer as "ideias" do adversário, mas o próprio adversário, pouco importando que seja por meios sem qualquer conteúdo ideológico explícito. Trata-se de ocupar o seu lugar, e não de provar que ele está do lado errado. Isso se obtém melhor pela desmoralização profissional, pela prova de incompetência ou de corrupção, pela humilhação pública, do que por um respeitoso "debate de ideias" que só faz conferir dignidade intelectual a quem, no mais das vezes, não tem nenhuma.
 A crítica de Heidrich vai ao ponto: 
[...] os grupos que, atualmente, mais nos influenciam culturalmente começaram no campo das ideias, quase que exclusivamente. E eles eram essencialmente professores que, por sinal, continuam ganhando mal e não sendo proprietários dos meios de produção intelectuais, dos quais Olavo clama pela tomada.
[...] Então deixemos a dominação material de lado e vivamos apenas de ideais? Não, mas a visão ideológica que deve ser endossada é justamente a que permite igualdade de direitos para que qualquer um possa deter domínio material próprio, que o torne o mais autônomo possível em relação a quem concentre mais recursos.
Eu já enfrentei várias vezes o problema de ver trabalhos meus serem rejeitados para publicação por veto ideológico - já contei um caso aqui e ainda vou contar outro -, mas nem por isso concordo com Carvalho de que devemos usar argumentos que não são de ordem teórica ou ideológica para fazer "desmoralização profissional". Admito que é impossível criticar as posições de esquerda sem reconhecer, com base em fatos, que os intelectuais críticos são dogmáticos, misturam indevidamente ciência e ideologia, partidarizam as funções públicas que exercem e, ainda por cima, recorrem frequentemente a mentiras para atacar o capitalismo ou mesmo para beneficiar os partidos de sua preferência. Mas admitir isso não significa fazer ataques pessoais, que é o que sobra quando se decide ir além do debate de ideias! Eu critico a ética profissional de autores como Chaui, Milton Santos, Conceição Tavares e Fiori, entre tantos outros, mas isso é muito diferente de atacar a moralidade dessas pessoas. A moral diz respeito ao comportamento dos indivíduos em suas vidas privadas, o que é muito diferente da ética, que trata das regras que devem reger o comportamento de grupos, como é o caso dos códigos de ética profissional.

Nesse sentido, eu não dou tomatadas metafóricas visando desmoralizar alguém e ocupar cargos na universidade ou em qualquer outro órgão para ter mais poder material de divulgação de ideias. Muito menos vou sair por aí chamando os autores de quem discordo de "canalhas", como faz o Olavo de Carvalho, ou de "cafajeste" e "pulha", como Marilena Chaui já fez com o mesmo Carvalho...

Meu objetivo ao jogar tomates virtuais é, antes de mais nada, científico. Viso apenas contribuir para restaurar o compromisso com a neutralidade na academia e nas intervenções dos intelectuais nos debates públicos. Noutras palavras, quero apenas ajudar para que a avaliação da credibilidade dos acadêmicos e das suas pesquisas seja feita apenas pelo critério do rigor lógico e empírico, e não com base na concordância ou discordância que possamos ter de certas bandeiras políticas e sociais relacionadas aos temas pesquisados.




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