Comemorações na Praça Tahrir, no Cairo após a renúncia do presidente egípcio
Imagem capturada na Internet (Fonte: Terra/Mundo - Foto: AFP)
A perspectiva era grande e o entusiasmo contagiou os mais otimistas, mas o desfecho da crise no Egito com a renúncia do seu presidente ? esperada ontem com o seu pronunciamento em cadeia nacional ? não aconteceu. Ela só veio a ocorrer mesmo, hoje, levantando o ânimo e as esperanças da população egípcia.
Muhammad Hosni Sayyid Mubarak, de 82 anos de idade, que estava no poder a quase três décadas deixou o cargo, hoje (11/02), embora em seu pronunciamento, ontem, o mesmo tenha ratificado, mais uma vez, a sua intenção real em aguardar a sucessão presidencial nas próximas eleições deste ano (setembro).
Ex-presidente Hosni Mubarak
magem capturada na Internet (Fonte: G1.Globo)
O anúncio de sua renúncia foi feito pelo vice-presidente egípcio Omar Suleiman na TV estatal egípcia Al Arabiya, provocando forte comoção e comemorações na praça Tahrir, no Cairo, onde milhares de manifestantes se encontravam reunidos.
De acordo com os últimos noticiários, o presidente Hosni Mubarak não aguentou a pressão popular e a crise instalada no país, cedendo aos apelos da população a sua saída do governo.
Pelo menos essa é a versão apresentada nas mídias, contradizendo radicalmente o seu discurso até ontem.
Com a sua renúncia (espontânea ou forçada, vamos saber ao certo!), Mubarak passou o poder ao Conselho das Forças Armadas. Segundo o porta-voz do Partido Nacional Democrático (NDP), do governo, Mubarak e sua família viajaram para o balneário de Sharm el-Sheikh, no mar Vermelho.
O Egito respirou aliviado e as comemorações se espalharam não só em território nacional, mas em outros países através dos seus imigrantes egípcios.
Para quem não está acompanhando os noticiários, vou tentar explicar a crise no Egito, movida por protestos populares, os quais tiveram início no dia 25 de janeiro deste ano, na praça Tahrir, no centro do Cairo, capital do país.A primeira manifestação popular contra o governo egípcio foi convocada por meio da rede social Facebook pelo ativista e director de marketing da Google para o Médio Oriente, Wael Ghonim.
Outros protestos em massa se sucederam pelas principais cidades do país. Além da capital (Cairo), Alexandria, Suez e Ismaília serviram de palco às manifestações populares.
O número oficial de mortos são bastante divergentes, mas segundo a estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU) cerca de 300 pessoas já morreram em decorrência das manifestações, nos confrontos com a polícia e o Exército.
Na tentativa de conter os protestos, o governo estabeleceu toques de recolher das 16h às 8 h (horário local) e o bloqueio de telefonia e da internet. O ativista Wael Ghonim ficou preso por 11 dias, sendo solto recentemente.
Até o ponto que eu tomei conhecimento, a telefonia celular estava sendo gradualmente restaurada, mas a Internet permanecia bloqueada no país. Com a saída do presidente, certamente, a situação vai se normalizar. Pelo menos é o que se espera!
Hosni Mubarak assumiu a presidência após o assassinato do então presidente egípcio, Anwar Sadat, em 1981, por militantes islâmicos durante uma parada militar no Cairo. Mubarak, na época, era o vice-presidente e mesmo estando presente no local, ele conseguiu sair ileso do ataque.
Desde que assumiu o governo do Egito, no dia 14 de outubro de 1981 (8 dias após o assassinato de Anwar Sadat), Mubarak já sobreviveu a pelo menos seis tentativas de assassinato.
Com um perfil anti-popular e sob um regime autoritário, durante a sua gestão como presidente (cerca de 30 anos), Mubarak se tornou um importante aliado dos países ocidentais e configurando-se como um estadista internacional com base na mesma questão que motivou a morte de Sadat: a busca da paz com Israel.
O Egito e a Jordânia são os dois únicos países árabes a terem Tratados de Paz com Israel. E a preocupação existente residia na possibilidade do levante popular no Egito se transformasse em uma revolução. Se tal situação caminhasse e se concretizasse como tal, seria um golpe duro para o já enfraquecido processo de paz no Oriente Médio.
Os manifestantes egípcios exigiam a saída imediata do presidente e a implantação de reformas democráticas no país, já que a repressão, a corrupção, inclusive, fraudes eleitorais sempre estiveram associados a sua gestão nestes anos todos. Além destes aspectos, a população atribui - ao governo - a responsabilidade pelos níveis de pobreza e do desemprego que assolam o país.
A respeito das próximas eleições, os manifestantes também impuseram garantias de que o seu filho, Gamal Mubarak, chefe do comitê político do Partido Nacional Democrático (NDP), não fosse o seu sucessor na presidência (o presidente egípcio também tem outro filho, Alaa Mubarak).
No domingo passado (06/02), no entanto, foram promovidas algumas mudanças na cúpula do partido governante do país (NDP) e uma delas foi a destituição de Gamal Mubarak do cargo de chefe do comitê político do NDP, sendo nomeado ? em seu lugar - o senador Hosam Badrawi.
Tal medida foi entendida por muitos como sinal de que o filho de Mubarak não irá disputar o cargo de presidente nas próximas eleições de setembro.
Todas estas mudanças realizadas, pelo então presidente egípcio, serviram para acalmar os ânimos da população insurgente e garantir a sua permanência no poder. De nada adiantou, pois os protestos continuaram mesmo com a presença e atuação dura das forças da polícia e do Exército.
Com tudo isso, outro aspecto merecia devida atenção e preocupação, segundo os analistas, pois os protestos populares poderiam dar bases e/ou ascender um movimento por parte de grupos islâmicos ou, pior ainda, estarem sendo instigados por estes numa tentativa de chegar ao poder mediante a crise política ou por meio de eleições livres.
O maior e mais organizado grupo de oposição no país é a Irmandade Muçulmana, grupo fundamentalista islâmico, ligado ao Hamas palestino. Este foi colocado na clandestinidade pelo presidente Mubarak sob pressão do Ocidente (EUA e a Europa), que teme que o referido grupo islâmico possa assumir o governo do país.
A Irmandade Muçulmana defende a adoção de leis religiosas no Egito, baseadas na sharia (código islâmico, fundamentado no Corão). Mas, o grupo ? a princípio - se manteve em uma posição discreta durante os protestos e os confrontos que se sucederam no país por temer retaliações por parte do governo.
Na verdade, os manifestantes não representavam um determinado segmento da população; representava a sociedade egípcia, independente de classe social, religião, sexo e faixa etária. Era uma manifestação popular, geral, por reformas democráticas no país.
Nestes últimos dias, até o posicionamento do Exército e do Conselho Militar Supremo do Egito deu bases para a cogitação de um possível golpe militar.
A Comunidade Internacional também reagiu face à crise no país. Os EUA, responsáveis por bilhões de dólares em ajuda para o Egito, se manifestaram contra a crise, pedindo uma ?transição ordenada? de poder.
Os líderes da ONU, da Grã-Bretanha, da França e da Alemanha chegaram a solicitar o fim da violência e a realização de reformas no país.Em contrapartida, tanto o rei da Arábia Saudita, Abdullah Bin Abdulaziz Al Saud, quanto o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, manifestou apoio a Mubarak, condenando os manifestantes por colocarem em risco a segurança e a estabilidade do país.
Como podemos perceber, a crise no Egito foi marcada não só pelos diversos aspectos associados ao regime autoritário versus o clamor popular por reformas democráticas, como havia em jogo, também, aspectos políticos, religiosos (extremos) e econômicos de amplitude mundial.
Durante os 18 dias de protestos, os efeitos da crise foram sentidos nos mercados globais, provocando a queda dos valores das ações nas principais bolsas do mundo e a elevação do preço do petróleo.
Com a renúncia de Mubarak, as ações nas bolsas de valores voltaram a subir.
Além do presidente egípcio, o Secretário-Geral do Partido Nacional Democrático, Hossam Badrawi, renunciou. Este havia assumido o posto, recentemente (06/02), após a renúncia do ex-Secretário-Geral, Safwat el-Sharif e de Gamal Mubarak, filho do presidente, mediante as mudanças políticas implantadas por Mubarak na tentativa de se manter no poder mesmo sob a pressão popular.
A renúncia do presidente Hosni Mubarak por pressão popular tem um significado muito forte e consolida a crise por qual perpassa o mundo árabe. O governo egípcio representa a segunda ditadura a ruir no Norte da África e na região sob influência árabe, em menos de um mês.
Para quem não recorda, a Tunísia passou por uma crise análoga, de insatisfação popular por motivos semelhantes (corrupção, ditadura e alto índice de desemprego), a qual se solidificou na chamada Revolução do Jasmim, ocorrida no dia 14 de janeiro, que resultou na fuga do ditador Zine el Abidine Ben Ali (23 anos no poder) que acabou se refugiando na Arábia Saudita.
Sob este mesmo contexto, outros países da África do Norte e do Oriente Médio seguem o processo democrático em busca de liberdade e o fim do regime autoritário de seus governantes, tal como a Mauritânia, Argélia, Jordânia e Iêmen.
Hoje, um grito só foi ouvido por milhares de vozes... "O povo derrubou o regime".
Protestos no Egito - Imagem capturada na Internet (Fonte: Correio Braziliense?)
Protestos no Egito - Imagem capturada na Internet (Fonte: Correio Braziliense?)
Protestos na Praça Tahrir (Fonte: A Tarde OnLine)
Fontes de Consulta:
. A Tarde On Line
. BBC Brasil Notícias
. Folha.Com
. Jornal O Globo (impresso/várias edições)
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