Fotos NASA
Espetáculo do cosmo
A galáxia M51 foi observada pela primeira vez pelo astrônomo francês Charles Messier, em 1773,
e pode ser vista da Terra por telescópios amadores. A imagem feita pelo Hubble, porém, é inédita
por revelar um esplendor de detalhes como nunca fora visto antes. Conhecida popularmente
como galáxia do redemoinho, ela está localizada a 31 milhões de anos-luz da Terra
(1 ano-luz significa 9,5 trilhões de quilômetros), em uma pequena constelação chamada Canes Venatici
Desde tempos imemoriais, o homem olha o céu e as estrelas com um misto de medo e fascínio. Nos últimos 400 anos, sinalizado pelo momento em que Galileu Galilei usou seu telescópio para estudar o que não podia ser visto a olho nu, o ritmo das descobertas astronômicas tornou-se frenético. As últimas duas décadas, em especial, compõem a idade de ouro da investigação cósmica ? e o responsável por isso é, em boa parte, o telescópio espacial Hubble. Em órbita a 570 quilômetros acima da Terra, o Hubble permitiu pela primeira vez um olhar cristalino do espaço-tempo. Os telescópios instalados na superfície têm a observação prejudicada pela atmosfera, que distorce as imagens e bloqueia parte do espectro visual, como as radiações ultravioleta e infravermelhas. "Antes do Hubble, era como se os astrônomos tentassem olhar o céu do fundo de uma piscina olímpica", disse a VEJA o americano Nolan Walborn, do Instituto Científico de Telescópios Espaciais, em Baltimore.
O Hubble foi colocado em órbita pelo ônibus espacial Discovery, em abril de 1990, e não funcionou muito bem nos primeiros anos. Um erro crasso de fabricação em um de seus espelhos, que distorcia as imagens, impediu sua utilização correta até 1995. Esse e outros problemas foram corrigidos por uma série de visitas de astronautas. Praticamente todas as partes, exceto o espelho principal, foram trocadas. O resultado é que o Hubble é hoje 100 vezes mais potente do que no dia de seu lançamento. Desde 1995, o telescópio já captou mais de meio milhão de imagens de deslumbrante beleza ? e cada uma delas ajudou a entender melhor a origem e a evolução do universo.
Devido ao tempo que a luz leva para chegar às proximidades da Terra, quanto mais distante o Hubble enxerga, mais ele está olhando para o passado. Em 2009, os astrônomos o usaram para registrar as imagens mais distantes já feitas, mostrando a formação de galáxias quando o universo era um jovem de apenas 600 milhões de anos. É quase o limite das possibilidades da investigação humana. Nos primórdios, a densidade do cosmo era tão elevada que, a exemplo dos atuais buracos negros, não deixava escapar luz alguma. Esse período, chamado de Idade das Trevas, constitui a barreira que nos impede de ver o próprio Big Bang, a expansão súbita de energias que deu origem ao universo.
Para a maioria das pessoas, o Hubble é conhecido principalmente por suas deslumbrantes imagens de nuvens de estrelas, poeira cósmica e choques de galáxias. Sua contribuição à ciência e ao conhecimento do universo é, evidentemente, muito mais ampla. Aqui estão alguns desses avanços científicos:
? Permitiu calcular a idade do universo em 13,7 bilhões de anos.
? Tornou possível a confirmação da existência de buracos negros no centro das galáxias.
? Registrou pela primeira vez a presença de atmosfera em um planeta fora do sistema solar.
? Mostrou que o universo está em expansão e em velocidade maiores do que se supunha.
A respeito desse último item, é curioso o fato de que, no lançamento do Hubble, a expectativa dos astrônomos era precisamente comprovar a desaceleração desse processo. O telescópio espacial mostrou que, ao contrário, quanto mais distantes estão as estrelas, mais rápido elas viajam. O que estaria causando a aceleração da expansão do universo é o tema que intriga os cientistas. A teoria mais aceita é a existência de uma força que se convencionou chamar de energia escura, de origem e magnitude ainda desconhecidas. "Além de recente, essa descoberta foi totalmente inesperada. A energia escura mudou o conceito de evolução do universo que tínhamos até pouco tempo atrás", disse a VEJA Roberto Dias da Costa, do Instituto de Astronomia da Universidade de São Paulo.
A que ponto chegará essa expansão? Ninguém sabe. Muitos cientistas acreditam que, quando o universo atingir o ponto máximo de expansão e não existir mais força para contrabalançar a gravidade, como hoje faz a energia escura, toda a matéria e toda a energia começarão a se contrair até se comprimir num único ponto infinitamente denso, a singularidade. Seria o Big Crunch, o contrário do Big Bang. Quando isso ocorreria? Não antes de 20 bilhões de anos.
A aposentadoria do Hubble já foi anunciada várias vezes. Em todas as ocasiões, o telescópio pôde continuar a operar devido aos consertos feitos por astronautas. Foram cinco missões de reparo e atualizações. A última delas, realizada no ano passado por uma equipe de sete astronautas a bordo do ônibus espacial Atlantis, foi filmada em 3D e agora está sendo exibida em cinemas Imax nos Estados Unidos, com narração de Leonardo DiCaprio. Desta vez, os dias do velho Hubble, com seus remendos e tecnologia ultrapassada, estão realmente contados. Deve deixar de funcionar em 2014, quando seu sucessor, o Telescópio Espacial James Webb, começar a operar a 1,5 milhão de quilômetros da Terra.
Arte no universo
As "pinturas" captadas pelo Hubble: o hidrogênio liberado pela nebulosa Carina (à esq.) forma uma imensa nuvem de poeira que se assemelha a uma explosão. A luz da estrela V838 Monocerotis (no centro) é tão intensa que ilumina a poeira que a circunda. Na nebulosa NGC 6302 (à dir.), os gases liberados na morte de uma estrela lembram a forma de uma borboleta
5 de maio de 2010
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