Houve um tempo, não muito distante, em que exaltar as maravilhas do Brasil era considerado como um sinal de alienação. Pura besteira. Não se esconde a realidade de um país deixando de reconhecer o que ele tem de melhor.
Aproveitando a oportunidade, se estamos em época de carnaval, nada mais apropriado recordar a frase do saudoso carnavalesco Joãosinho Trinta (1933-2011), quando execrado publicamente pelos excessos das fantasias e alegorias da sua escola, a Beija-Flor de Nilópolis: ?O povo gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual?.
Joãosinho Trinta, vestido de gari, lavando a alma de alegria na Sapucaí
Aliás, foi na mesma Beija-Flor, em 1989, que Joãosinho deu um tapa na cara dos críticos ao colocar na avenida um desfile revolucionário, diferente de tudo o que já tinha sido realizado até então, o antológico "Ratos e urubus, larguem minha fantasia", quando a Sapucaí foi invadida por uma turba de excluídos, mendigos, meninos de rua e desocupados, regidos com maestria ao som do empolgante samba-enredo interpretado magistralmente por Neguinho da Beija-Flor. Foi uma verdadeira catarse coletiva, de proporções épicas.
Ainda que a catarse coletiva de proporções épicas do desfile daquele ano não tenha dado o título para a Beija-Flor, pouco importa. Foi uma apresentação de gala que fez história. O carro alegórico ?Cristo Mendigo? foi censurado por ser considerado ofensivo à Igreja e, numa sacada criativa, totalmente coberto com um plástico preto, com uma faixa com os seguintes dizeres: ?Mesmo proibido, olhai por nós!?
Homenageado no desfile deste ano pela escola de Nilópolis com o enredo "São Luís, o poema encantado do Maranhão", terra natal de Joãosinho Trinta, num tributo mais do que merecido ao carnavalesco que fez a diferença ao tirar do anonimato uma pequena agremiação da Baixada Fluminense e colocá-la no seleto grupo das grandes do carnaval carioca.
Reluziu... É ouro ou lata
Formou a grande confusão
Qual areia na farofa
É o luxo e a pobreza
No meu mundo de ilusão
Xepa, de lá pra cá xepei
Sou na vida um mendigo
da folia eu sou rei
Sai do lixo a pobreza
Euforia que consome
Se ficar o rato pega
Se cair urubu come
Vibra meu povo
Embala o corpo
A loucura é geral
Larguem minha fantasia
Que agonia... Deixem-me
Mostrar meu carnaval
Firme... Belo perfil!
Alegria e manifestação
Eis a Beija-flor tão linda
Derramando na avenida
Frutos de uma imaginação
Leba - laro - ô ô ô ô
Ebó lebará - laiá - laiá ? ô
Reluziu...