Imagem capturada na Internet (Fonte: Google)
Texto atualizado em 01/08, às 18h06
Tal como prometi e atendendo alguns alunos, a postagem de hoje versa sobre um tema bastante polêmico, o qual foi tratado nas turmas do 7º ano e, depois, retomado, pois virou notícia nos principais veículos de comunicação, inclusive, citado por alguns alunos, que leram, ouviram e associaram a notícia à matéria dada.
Estou falando dos ?brasiguaios?, isto é, dos milhares de brasileiros que migraram para o Paraguai, principalmente à partir da década de 70 (século XX), atraídos pela oferta de trabalho e pelas terras férteis e baratas.
Considerados, ao longo dos anos, como a mais importante força produtiva do campo no Paraguai, sobretudo, com a monocultura da soja na região fronteiriça com o nosso país, o grande número de imigrantes brasileiros formou um verdadeiro "espaço brasiguaio" na porção leste do Paraguai.
No entanto, muitos emigrantes brasileiros estão retornando ao Brasil, expulsos das terras por policiais, milicianos, camponeses e, sobretudo, pelos campesinos (os sem-terra paraguaios).
Esta situação conflitante entre ambas as partes não é recente. Várias outras ocorrências de êxodo rural, similares e forçadas, vêm acontecendo ao longo dos anos.
As razões são diversas e a responsabilidade pelo problema em si não cabe apenas a um, mas a ambos os países envolvidos (Brasil e Paraguai).
Espero ser sucinta na explicação e indicarei outras leituras, no final deste post, para quem desejar se aprofundar mais no assunto.
O processo migratório brasileiro às terras paraguaias começou no final dos anos 60 e, sobretudo, a partir dos anos 70 (século XX), envolvendo não só pequenos trabalhadores rurais, como também latifundiários brasileiros e empresas privadas (ligadas principalmente à agroindústria de soja).
Como se pode ver, o termo ?brasiguaio? é empregado de forma generalizada para todos os emigrantes brasileiros que migraram para o Paraguai em busca de novas terras para colonizar e cultivar, ou seja, abrange tanto os pequenos proprietários rurais quanto os latifundiários e/ou os agroindustriais.
Os brasiguaios ocuparam, preferencialmente, a porção leste do Paraguai, na fronteira com o nosso país, desenvolvendo um verdadeiro espaço de brasileiros dentro de um território estrangeiro. Só para se ter uma ideia acerca da dimensão de sua ocupação, as estimativas apontam tratar-se da maior migração de brasileiros em um país fronteiriço, bem como estes representam a segunda maior comunidade de brasileiros no exterior (a maior é nos EUA).
A origem dos emigrantes brasileiros também não é a mesma, estes derivam de diferentes estados e ocuparam posições sociais distintas. Um destes fluxos de emigrantes era composto de nordestinos e mineiros que migraram, primeiramente, para o estado de São Paulo e para o Norte e Oeste do Paraná. Estes trabalhadores rurais se tornaram principalmente peões, arrendatários e posseiros. Segundo fontes de pesquisas, a ida deles para o Paraguai foi realizada por empresas colonizadoras e fazendeiros estabelecidos no Paraguai.
O outro fluxo correspondeu aos produtores rurais gaúchos que se deslocaram, inicialmente, para Santa Catarina, Oeste do Paraná e Mato Grosso do Sul. Estes, por sua vez, constituíram-se majoritariamente como colonos, pequenos e médios proprietários.
Outros grupos de procedências diferenciadas no âmbito do nosso país e de outros países também se deslocaram para o Paraguai.
Internamente, vários fatores justificam a migração de brasileiros para o referido país sul-americano e vizinho. Entre os principais, podemos destacar:
- o processo de modernização da agricultura brasileira, a partir de meados do século XX, que resultou na desapropriação de milhões de pequenos produtores, arrendatários, parceiros etc, ocasionando o êxodo rural;
- o aumento e concentração de propriedades rurais nas mãos de empresas privadas, modernas e altamente tecnificadas, as quais contavam com fácil financiamento para compra de máquinas, insumos e facilidades de comercialização;
- a construção da hidrelétrica de Itaipu, na década de 70 (século XX), cuja obra provocou a desapropriação de 42 mil habitantes do sudoeste do Paraná, em sua maioria de pequenos produtores;
- a política de incentivos à chamada ?marcha para o oeste? pelos governos federais desde à época de Getúlio Vargas passando pelo período da ditadura militar brasileira.
Por outro lado, em território paraguaio, durante o período da ditadura do presidente Alfredo Stroessner (1954-1989), este promoveu uma política de incentivo à colonização da porção leste do país (a chamada ?Marcha al Este?). Região esta, coberta por floresta e ocupada por grupos indígenas, traficantes de madeira e por empresas de extração da erva-mate.
Seu objetivo principal era reassentar os camponeses que viviam na área central do país, a mais populosa. O presidente Stroessner, além de criar o Instituto de Bienestar Rural ? IBR (atual Instituto Nacional de Desarrollo Rural y de la Tierra - Indert), responsável pela reforma agrária e várias colônias oficiais no país, reformulou o estatuto agrário, em 1963, permitindo a venda de terras aos estrangeiros nas áreas de fronteira.
Ao referido presidente, já falecido (2006), consta que ele doou? de forma irregular - terras na fronteira a alguns amigos.
Assim sendo, o seu plano de colonização facilitou a entrada de brasileiros, que promoveram a derrubada da mata e posterior cultivos de produtos agrícolas.
Administrativamente, o Paraguai é dividido em Departamentos e estes em distritos. Só para uma melhor compreensão, o Brasil é dividido em estados e estes em municípios. Pois bem, os colonos brasileiros ocuparam, principalmente, os departamentos fronteiriços de Alto Paraná, Canindeyú e Amambay, enquanto que os campesinos paraguaios que se migraram dos departamentos centrais ocuparam os departamentos vizinhos de Caaguazu e Caazapá.
Muitas culturas de subsistência foram substituídas pelo plantio de soja e, com isso, vários pequenos produtores rurais, paraguaios e brasileiros, tiveram que migrar para outras frentes agrícolas no interior do Paraguai e/ou para as periferias das cidades de fronteira.
Com o aumento dos ?Sem terras paraguaios?, os chamados campesinos, as hostilidades aumentaram em relação aos imigrantes (brasileiros). Na verdade, a eleição do presidente Fernando Armindo Lugo de Méndez, em abril de 2008 é apontado como o marco da hostilidade contra os brasiguaios, pois este ? durante a sua campanha eleitoral - prometeu promover uma reforma agrária integral, a qual foi considerada pelo Movimento Sem-Terra tratar, inclusive, da desapropriação das terras dos brasiguaios.
No mês seguinte, na cidade de Curupaiti (departamento de San Pedro), uma bandeira brasileira foi queimada em praça pública e a onda de violência entre campesinos e brasiguaios prolongou por semanas.
O referido presidente esclareceu que a desapropriação seria realizada nas terras que o ditador Alfredo Stroessner entregou a amigos, de forma irregular, assim como em outras, também, irregulares (sem título de posse).
Perseguidos, centenas de brasiguaios tiveram suas propriedades invadidas e depredadas, principalmente, pelos sem-terras paraguaios (os campesinos) e, em consequência disso, tiveram que retornar ao Brasil.
O foco principal é com os brasileiros que não possuem títulos de posse ou regularizados das terras, mesmo para aqueles que há décadas vêm produzindo.
Essa intolerância e perseguições contra os brasiguaios, de características xenófobas, isto é, de aversão, preconceito ao imigrante, tende a crescer. Contudo, vale ressaltar que a xenofobia está concentrada entre os sem-terra e outros grupos ultranacionalistas, ou seja, não é um sentimento generalizado no país.
Um outro aspecto que merece ser salientado é o fato que a hostilidade praticada contra os brasiguaios se encontra associada, também, a outras questões associadas à migração e ocupação de brasiguaios na porção fronteiriça do Paraguai.
Estas questões perpassam pela posse de terras agrícolas, mas também aos problemas ambientais e sociais consequentes pela derrubada da floresta, o uso indiscriminado e comprometedor de agrotóxicos e pela invasão de áreas indígenas (há registro de que as terras tradicionais da tribo Avá Guaraní, incluindo o cemitério, teriam sido apossadas ilegalmente por brasiguaios).
O problema é bastante complexo e envolvem fatores históricos de ordem política, demográfica, ambiental e econômica por ambas as partes, isto é, tanto de responsabilidade brasileira quanto e, sobretudo, paraguaia.
Em território brasileiro, a preocupação aumenta gradativamente e, principalmente, no município de Itaquaraí (Mato Grosso do Sul), no qual se dirigiram cerca de 1,5 mil brasiguaios expulsos das terras paraguaias. Estes acamparam ao longo do encostamento da BR-163, entre o referido município e a cidade de Naviraí, a 390 Km de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul (MS).
De acordo com a prefeita, Sandra Cassone (PT), a cidade não possui infra-estrutura capaz de comportar este quantitativo de novos moradores. Nem a cidade e nem outra.
O s brasiguaios que retornaram fazem parte de várias gerações e o seu número elevado e, certamente, crescente vai gerar um grave problema social em nosso país.
. Brasiguaios ameaçados pelos sem-terra de Fernando Lugo (Fábio Campana)
. Brasileiros no Exterior, a história dos Brasiguaios ? Soja: a expansão dos negócios (LADEM ? UFJF)
. Paraguai: Nova Potência na Produção de Grãos (Gazeta do Povo)
. Prefeita pode decretar situação de emergência por invasão de brasiguaios no Mato Grosso do Sul (R7 ? Notícias)