Ou os europeus são burros, ou a produção agrícola familiar pode ser dispensável
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Ou os europeus são burros, ou a produção agrícola familiar pode ser dispensável


Uma coisa intrigante quando lemos os estudos que tratam da agricultura como atividade econômica é que muitos autores afirmam categoricamente que o agricultor familiar é mais produtivo do que o patronal. Asseguram que os pequenos proprietários fazem uso mais eficiente dos recursos, sobretudo da mão de obra, e que produzem mais por unidade de área. E, ainda assim, esses mesmos autores clamam por ajuda para os pequenos produtores, exigindo que o Estado lhes dê assistência técnica, financiamento a juros baixos, mercado cativo (como o de produtos para merenda escolar), subsídios de preço, barreiras à importação de alimentos, e por aí vai. Mas não é estranho que o setor mais eficiente e produtivo precise tanto que o Estado lhe conceda benefícios de toda ordem, mesmo que a fundo perdido, para não desaparecer?


Esse paradoxo assume a forma de contradição gritante quando lemos a avaliação do agrônomo Xico Graziano sobre a política agrícola europeia:
Agora, na Europa, mudará a política comum: os agricultores receberão os subsídios mesmo que não produzam, compromissando-se a manter belas suas propriedades e eternas suas moradias, em harmonia com o meio ambiente, cuidando também do bem-estar animal. Esse é um conceito superatual, impensável há uma década: a chamada multifuncionalidade do campo (Graziano, 2004, p. 87 - itálico no original).
Engraçado... muitos acadêmicos, especialmente geógrafos, insistem que a agricultura familiar não só é mais eficiente como consegue produzir de forma ambientalmente sustentável. No entanto, essa proposta de política agrícola (!?) consiste em dar dinheiro para o produtor ser caseiro do seu próprio sítio, dispensando os alimentos que ele poderia produzir com tanta eficiência e, portanto, a baixos preços. Assume-se que o campo é multifuncional, pois oferece, além de alimentos e matérias primas de origem agropecuária, belas paisagens, culturas regionais diferenciadas e um meio natural agradável e "harmônico". Tudo isso para o bem da vida na Terra e para o desfrute de estressados citadinos ansiosos por fazer turismo rural.

Mas, na medida em que a concessão de subsídios pode ser feita dispensando-se o produtor de produzir, disso devemos deduzir que a menos importante das funções do campo é a produção de comida? Ou seria mais razoável concluir que a função menos importante da agricultura familiar é produzir alimento?

Esses europeus devem ser muito burros. Pagam caro pelo alimento produzido pela agricultura patronal e doam dinheiro a "camponeses" que abandonam a produção eficiente de comida para serem zeladores de suas propriedades. Agora, se não faltar inteligência aos europeus, então há algo de muito errado nesses estudos que atribuem produtividade superior à agricultura familiar. Volto a isso noutra hora.

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GRAZIANO, X. O carma da terra no Brasil. São Paulo: A Girafa Editora, 2004.




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