Em 40 anos a humanidade deve atingir 9,2 bilhões de habitantes
De todos os filósofos e pensadores da economia política que vicejaram desde o século XVIII, nenhum foi objeto de críticas tão unânimes quanto Thomas R. Malthus, autor em 1798 de um livro famoso: Um ensaio sobre o príncípio da população e sobre o modo como afeta o aperfeiçoamento futuro da sociedade. O pessimismo de sua tese, segundo a qual ?há uma constante tendência em todas as formas de vida animada a crescer além dos estoques de alimentação disponíveis para ela?, jamais granjeou consenso. Pois a tal pessimismo, opunham-se dois tipos de otimismo. Os ?integrados?, ou seja, os otimistas liberais, sempre acusaram Malthus de miopia apocalíptica, argumentando que a simbiose entre a livre-iniciativa e a tecnologia seria capaz de prover indefinidamente a demanda global de alimentos. A ?revolução verde? deu-lhes razão. De seu lado, os ?apocalípticos?, vale dizer, os otimistas quanto à capacidade humana de superar o capitalismo, sempre o consideraram um ?integrado?, um reacionário empedernido, contrário até mesmo à mais tímida legislação paliativa da pobreza. O progresso da legislação social desde a Revolução Francesa também deu-lhe razão.
Mas as coisas mudaram. Transcorridos 210 anos do ensaio de Malthus, esses dois tipos de otimismo debatem-se em crises terminais, enquanto o pessimismo malthusiano retorna. Dados da ONU: em 2008, a população urbana do planeta está se equiparando à população rural; beiramos hoje 6,8 bilhões; em 70 anos, de 1950 a 2020, mais que triplicaremos; nos próximos 40 anos atingiremos a marca de 9,2 bilhões de indivíduos: 50% a mais que a população de 2000; em 2050, 6,4 bilhões de pessoas ? o equivalente à população atual do planeta! ? apinhar-se-ão em cidades. Portanto, em 40 anos (2010-2050), a população urbana, sempre sequiosa de alimentos, duplicará.
Haverá 50% a mais de alimentos no planeta em relação à produção já insuficiente de 2000? A resposta é não. A revolução verde atingiu seus limites. Ela foi possível por causa do petróleo abundante e barato e a conseqüente petroquímica dos fertilizantes e defensivos agrícolas. Enxertamos no solo quantidades imensas de energia fóssil. Segundo Richard Manning (The oil we eat, O petróleo que comemos) ?as plantações de Iowa [EUA] requerem a energia de 4 mil bombas de Nagasaki por ano?. E esse é o padrão atual da agricultura de escala. Ora, é consenso que a tecnologia será incapaz de descobrir novas jazidas de petróleo em ritmo compatível com o do crescimento da demanda. O esgotamento das reservas petrolíferas é um fato. Ela já acarreta o aumento implacável dos preços do petróleo e o dos alimentos agrícolas, analisado por Paul Krugman em artigo do Washington Post de 7 de abril (?Grains gone wild?, Os grãos enlouqueceram). Isto para não falar no pior: o declínio dos cardumes e a demanda crescente por gado de corte, voraz consumidor de florestas e grãos, com custos ambientais terrificantes. Mas é melhor parar por aqui: neste assunto os carnívoros humanos nem querem ouvir falar.
Luiz Marques é professor de história da arte medieval e moderna da Unicamp.
Revista História Viva