Maior favela da Europa abriga 44 mil pessoas em Madri
Luisa Belchior
Crianças brincam em uma favela sem saneamento básico. No chão, lama, fezes humanas, lixo e seringas de usuários de drogas. O poder público só se nota em um carro de polícia que vigia viciados em cocaína e heroína vagando por um descampado ao redor de uma paróquia.
A situação de precariedade -pior do que a de muitas favelas do Brasil- retrata um domingo na Cañada Real Galiana, a menos de 15 km de Madri, na Espanha.
Essa é a maior favela do continente europeu, onde vivem 44 mil pessoas, entre ciganos, espanhóis, romenos e marroquinos. Uma espécie de parêntesis no Estado de bem-estar social que a Europa luta para manter entre seus cidadãos. E que os moradores dali nem sequer conhecem. Sua luta, com o agravamento da crise econômica, é pela sobrevivência.
"Antes da crise, dava para tirar uns ? 20 por dia. Agora não mais que ? 6. Não dá nem para a comida das crianças", diz Florenza Virzoga, 26, cigana romena que, como a maioria de suas conterrâneas, vive de esmolas.
Antigo caminho de gado, toda a extensão da Cañada Real é considerada área pública. Há 40 anos, casas surgiram no terreno. Virou moradia de espanhóis que iam a Madri trabalhar na criação de gado. Depois, foi ocupada por ciganos espanhóis. Marroquinos muçulmanos também ocuparam o local e, mais tarde, ciganos romenos ergueram um assentamento por lá.
Um lixão, construído na década de 80, e uma paróquia, há oito anos, completaram o cenário da favela.
O espaço é estreito, mas bem demarcado: em uma ponta vivem os romenos. Na outra, os ciganos espanhóis. No meio deles, marroquinos.
O trecho dos romenos, o Gallinero, é o mais precário. Ali, os barracos, erguidos sobre lama, são feitos de pedaços de madeira e lona.
Mesmo assim, todos os entrevistados pela reportagem disseram preferir morar ali a viver em seu país de origem.
"Na Romênia, vivíamos em acampamentos, sem comida, sem trabalho. Aqui temos um lugar e as pessoas ajudam", diz a romena Maria Radu, 23, sentada na cama, no único cômodo do barraco de 30 m².
A Anistia Internacional pede ao governo espanhol condições mínimas de saneamento básico, mas Madri estuda desalojar a favela, alegando ser uma via pública.
(Folha de São Paulo - Mundo, 01 de janeiro de 2012)