Fundada mais de cem anos atrás, Kibera abriga cerca de 1 milhão de habitantes, um quinto da população de Nairóbi (capital do Quênia), e até recentemente não figurava em nenhum projeto governamental. A favela é formada por 15 comunidades. Uma delas, Mashimoni, é repleta de cabanas de lama e casas de latão. A única infraestrutura formal é um banheiro, recém-construído.
Boniface Ouma, morador de Kibera há 37 anos, diz que as mudanças são perceptíveis: a região agora tem ruas asfaltadas, clínicas móveis e postos policiais instalados em contêineres, iluminação nas ruas e até wi-fi. Uma das principais questões, no entanto, é a moradia. Os moradores não têm títulos de propriedade de suas casas, então tecnicamente os terrenos ainda pertencem ao governo. Isso não impede os descendentes dos moradores originais de sublocarem seus casebres para moradores mais recentes.
Agora, porém, o governo está construindo casas permanentes, com condições sanitárias adequadas. Anne Waiguru, ministra do Planejamento do Quênia, disse à BBC que o governo quer "que essas novas casas se tornem o padrão mínimo para os moradores de Kibera".
Banheiros voadores
Ainda que a vida em barracos improvisados e sem rede de esgoto continue sendo a realidade para muitos dos moradores, uma nova Kibera está tomando forma. Lojas de roupa, açougues, padarias e mercearias foram reconstruídos; caminhões de lixo ? ainda que raros ? são vistos nas ruas, enquanto trabalhadores constroem novas estradas e encanamentos.
A reportagem vê dez pessoas trabalhando para desbloquear uma das principais redes de esgoto, instalando drenos. A rede está repleta de lixo, e o cheiro de dejetos humanos toma conta do ambiente. "Se conseguirmos manter o encanamento limpo, será menos provável que as crianças adoeçam", diz um transeunte.
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Nairóbi, Quênia. |
Por ali, uma das novidades mais bem-vindas são os novos banheiros com descargas. Antes, moradores usavam sacolas de plástico para recolher seus dejetos, depois jogados nos rios mais próximos ou mesmo nas ruas. Eram os chamados "banheiros voadores". "Agora não pegaremos mais doenças como antes", diz Catherine Mueni, moradora antiga da favela. O governo diz que planeja construir 182 banheiros comunitários na favela. Por enquanto, 90 estão completos.
Desemprego
Cerca de 50% dos trabalhadores da favela trabalham em Nairóbi, em geral como mão de obra barata e de pouca qualificação. Mas o desemprego ainda é alto, sobretudo entre os jovens. Muitos moradores passam o dia à toa, em geral envolvendo-se em brigas com a polícia ou consumindo drogas e álcool.
Como parte da revitalização, alguns jovens moradores estão sendo estimulados a empreender: a ideia é que eles vendam alimentos produzidos localmente, como couve, milho e peixe. Mas Boniface Oruma está preocupado com o futuro desses projetos. "Precisamos de soluções de longo prazo, e alguns projetos, como esse dos vegetais e de lagos para peixes, não são realmente sustentáveis a longo prazo." Outros jovens estão sendo recrutados para trabalhar na construção civil. Desde o início dos trabalhos de modernização, 5 meses atrás, mais de 3,5 mil pessoas foram empregadas.
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Situação precária em Kibera. |
Como todo o trabalho é feito pelos próprios moradores, o governo espera que, quando a reforma de dois anos acabar, a comunidade possa continuar a construir mais casas. Quanto às novas estradas, a vendedora ambulante Millicent Atieno diz que trata-se de uma faca de dois gumes. "Ficou mais fácil chegar ao mercado e os meios de transporte me deixam bem em frente à minha tenda", diz ela. No entanto, como algumas casas foram removidas pelo governo, ela tem menos clientes morando perto.
Mudança duradoura?
Até recentemente, Kibera não tinha água encanada, e os moradores recorriam à água suja da represa de Nairóbi. Dirigindo pelas comunidades da favela, a reportagem da BBC viu diversas filas de moradores que queriam usar a torneira comunitária, um avanço em relação às águas turvas da represa. Autoridades acreditam que, se os moradores forem diretamente envolvidos na renovação de Kibera, cuidarão para que os avanços sejam preservados. Maria Kowa, 32, mãe de três filhos, concorda. "Esta é a nossa casa. Se não cuidarmos dela, depois de tudo, só poderemos culpar a nós mesmos", diz ela. "Fico feliz em ver que meus filhos não terão as mesmas dificuldades que eu tive." Ela espera que coletar água da represa seja coisa do passado e sonha com o dia em que tenha água corrente dentro de sua casa. Esse dia ainda está longe, mas muitos moradores esperam que ao menos Kibera deixe de ser sinônimo de caos e pobreza extrema para se tornar apenas um bairro a mais em Nairóbi.
Fonte: BBC.
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