Governo anuncia nesta segunda regras para exploração do  pré-sal
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A  aprovação pela Câmara dos Deputados de uma emenda  ao projeto de lei que  muda as regras de distribuição dos royalties do  petróleo colocou o  governo federal, Estados e municípios diante de uma  polêmica envolvendo  disputas políticas e interesses regionais.
Na  semana passada, os deputados decidiram que os  royalties - espécie de  compensação financeira paga pelos exploradores -  devem ser distribuídos  de forma igualitária entre todos os Estados e  municípios do país.
A  decisão muda a regra atual, em que Estados e  municípios produtores  recebem uma parcela maior dos royalties pagos  pelas empresas.
A  emenda aprovada pela Câmara será ainda  encaminhada ao Senado, mas a  decisão entre os deputados já foi  suficiente para deflagrar a polêmica  sobre quem deve receber a verba  gerada com a exploração do petróleo.
Entenda  o debate.
O  que são royalties e como são cobrados?
De modo  geral, royalty é um valor cobrado pelo  proprietário de uma patente ou  ainda por uma pessoa ou empresa que detém  o direito exclusivo sobre  determinado produto ou serviço.
No caso  do petróleo, os royalties são cobrados  das concessionárias que  exploram a matéria-prima, de acordo com sua  quantidade, e o valor  arrecadado fica com o poder público.
De  acordo com a legislação brasileira, Estados e  municípios produtores ?  além da União ? têm direito à maioria absoluta  dos royalties do  petróleo. A divisão atual é de 40% para a União, 22,5%  para Estados e  30% para os municípios produtores. Os 7,5% restantes são  distribuidos  para todos os municípios e Estados da federação.
A  justificativa para essa divisão é de que os  royalties são uma espécie  de compensação às administrações locais, pelo  fato de o recurso ser  finito. Além disso, essas localidades em tese têm  mais gastos com  infraestrutura e prevenção de acidentes, por exemplo.
Segundo  a Agência Nacional do Petrólo (ANP), o  Brasil arrecadou R$ 7,9 bilhões  em royalties no ano passado.
Por  que a distribuição de royalties  voltou ao centro da discussão?
Com a  descoberta da camada pré-sal, o governo do  presidente Luiz Inácio Lula  da Silva passou a defender novas regras  para a exploração do petróleo  no país.
Um dos  argumentos é de que as empresas terão  acesso a reservas de alto  potencial e com risco exploratório perto de  zero ? o que justificaria  um novo marco regulatório.
Foi  nesse contexto que o presidente Lula  apresentou, em agosto do ano  passado, quatro projetos de lei propondo  mudanças no setor, sendo um  deles na distribuição dos royalties.
O  governo Lula, que chegou a defender a  distribuição igualitária dos  royalties, voltou atrás diante da pressão  dos Estados produtores e  passou a defender um tratamento diferenciado  para essas administrações.
Mas os  deputados não aceitaram a proposta e  aprovaram uma emenda, apresentada  pelos deputados Ibsen Pinheiro  (PMDB-RS), Humberto Souto (PPS-RS) e  Marcelo Castro (PMDB-PI), que prevê  a distribuição dos royalties do  pré-sal para todos os Estados da  federação.
A  divisão aprovada na Câmara por 369 votos a  favor e 72 contrários é de  que  30% dos royalties sejam destinados aos  Estados, 30% aos municípios  e 40% à União, sem tratamento diferenciado  para os produtores.
A  chamada ?emenda Ibsen? foi além da camada  pré-sal e estendeu a nova  distribuição de royalties também às bacias  tradicionais, incluindo as  já licitadas.
Cálculos  apresentados pelo deputado Humberto  Souto mostram que o Estado do  Piauí, por exemplo, poderá receber R$ 317  milhões em royalties ainda  este ano, enquanto o Rio de Janeiro, maior  Estado produtor, ficaria com  cerca de R$ 200 milhões.
Quais  são os argumentos a favor da nova  distribuição?
O  principal argumento dos parlamentares  favoráveis à mudança das regras é  de que o petróleo pertence ?a todo o  país?, o que justificaria uma  distribuição igualitária dos royalties.
Segundo  o deputado Marcelo Castro, ?não  interessa que a exploração seja feita  de frente para o Rio de Janeiro?.  Para ele, é preciso usar o petróleo  para fazer ?justiça social? e  ?reduzir desquilíbrios? regionais.
Na  avaliação do deputado Ibsen Pinheiro, a  exploração do petróleo é feita  no mar, não havendo, segundo ele,  possibilidade de danos para Estados e  municípios produtores.
Ainda  de acordo com o deputado, não seria  ?justo? privilegiar dois Estados e  ?prejudicar? 25. Em entrevista ao  site G1, Ibsen disse que os Estados  produtores ?têm, no máximo, vista  para o mar, que é muito  privilegiada?.
Os  defensores da distribuição igualitária dizem  também que todos os  Estados acabam pagando, por meio da União, pelas  pesquisas da Petrobras  e pelos testes nos poços ? e por isso devem ser  beneficiado com  royalties.
?Essa  matéria tem fundamento jurídico,  fundamento moral e maioria. Nada  justifica a desigualdade?, disse Ibsen,  durante a votação da emenda.
Ainda  de acordo com o deputado, ?é justo que o  petróleo pertença a todos os  brasileiros, pois todos somos iguais  perante a lei?. O deputado  Fernando Coruja (PPS-SC) acrescentou que a  regra ?inverte a  concentração de recursos?, permitindo que os municípios  com menos  dinheiro ?participem da riqueza do petróleo?.
O  que dizem os Estados e municípios  produtores?
A  emenda Ibsen tem sido fortemente criticada  pelas lideranças do Rio de  Janeiro e do Espírito Santo, que descreveram a  medida como ?covardia?. O  governador do Rio, Sergio Cabral Filho,  chegou a chorar em público ao  comentar a decisão da Câmara.
Segundo  ele, os deputados que votaram a favor da  emenda esperando algum  ?benefício eleitoral? em seu Estado estão  ?equivocados?. Sua avaliação é  de que a população brasileira será  ?solidária? ao Rio.
De  acordo com cálculos apresentados pelo  deputado Otávio Leite (PSDB-RJ), a  arrecadação do Estado do Rio de  Janeiro com royalties do petróleo  cairia de R$ 5 bilhões para cerca de  R$ 100 milhões.
O  governador do Rio disse que a perda de receita  afetará as obras para os  Jogos Olímpicos de 2016 e convocou a população  para uma caminhada no  centro da cidade, na quarta-feira.
Representantes  dos Estados produtores veem ainda  ?falhas jurídicas? na emenda, por  mudar as regras de contratos já  firmados, no caso dos poços que já  foram licitados.
?Campos  já licitados, já leiloados, não podem  ter as regras mudadas, porque  isso fere os princípios jurídicos, muda  cláusulas de situações já  consagradas?, disse o senador Francisco  Dornelles (PP-RJ).
Existe  a possibilidade de um acordo?
A  aprovação da emenda Ibsen criou um embate  entre os Estados da  federação, com Rio de Janeiro e Espírito Santo de um  lado, e as outras  25 unidades do outro.
Diante  da disputa regional, lideranças do  governo Lula tentam agora costurar  uma nova proposta antes que a matéria  seja votada no Senado.
Uma das  alternativas apresentadas pelo deputado  Ibsen Pinheiro é de que a  União use sua cota na distribuição dos  royalties para compensar pelo  menos parte das perdas nos Estados e  municípios produtores.
Segundo  o deputado, os prejudicados poderão ser  compensados pela União até que  a produção de petróleo atinja níveis que  garantam os atuais patamares  de remuneração.
No  entanto, o senador Romero Jucá (PMDB-RR),  líder do governo na Casa  rebateu essa possibilidade.
A ideia  do governo, agora, é elaborar um projeto  de lei específico sobre a  questão dos royalties. Dessa forma, a matéria  poderia ser apreciada  normalmente (sem o pedido de urgência), o que  daria tempo para que o  assunto seja melhor discutido.
Caso os  senadores mantenham a emenda que  redistribui os royalties, o  presidente Lula poderá vetá-la ou não. A  partir daí o veto presidencial  terá de ser votado por deputados e  senadores, em sessão conjunta.
Quais  são as implicações eleitorais do  debate?
A  discussão sobre os royalties do petróleo tem  um forte apelo eleitoral,  com potencial de desgaste tanto para governo  como para a oposição.
No caso  do governo, esse potencial tende a ser  maior, já que o presidente Lula  está diretamente envolvido no debate,  podendo vetar ou não a decisão  do Senado.
Se os  senadores concordarem com a redistribuição  dos royalties, o presidente  Lula terá de decidir se fica do lado dos  dois Estados produtores ou do  restante do país.
?Seria  um decisão desgastante em meio à campanha  da ministra Dilma Roussef?,  diz um deputado da base aliada ao governo,  referindo-se à pré-candidata  do PT ao Palácio do Planalto.
O  assunto também é visto com receio pela  oposição, que teme se indispor  com o restante do país em pleno ano  eleitoral.
O  governador de São Paulo e possível candidato à  Presidência, José Serra,  tem evitado criticar de forma mais contundente  a emenda Ibsen, mesmo  estando à frente de um dos três Estados  produtores de petróleo.
Serra  disse nesta quarta-feira que distruibir os  benefícios do petróleo para  todo o Brasil é uma ?preocupação correta?,  mas que o projeto, do jeito  que está, é ?inaceitável?.
A  avaliação de um deputado da oposição é de que o  governador está prestes  a oficializar sua pré-canditura à Presidência e  que ?comprar briga?  com o restante do país ?teria um alto custo?.