Geografia
Economia verde é novo discurso hegemônico, diz pesquisadora
Os defensores da economia verde têm no seu horizonte saber como o capitalismo vai viver para além dos combustíveis fósseis. A economia verde surge como alternativa para viabilizar não só a expansão da atual economia petroleira até seu limite, mas também o controle das novas fontes de energia pelas mesmíssimas empresas e grupos de poder que mandam no petróleo, avalia Camila Moreno, pesquisadora e coordenadora de sustentabilidade da Fundação Heinrich Böll.
Rodrigo Otávio
Rio de Janeiro - ?Economia verde é o novo discurso hegemônico. E não agora para a Rio+20. Ela é o marco de aonde a gente vai organizar a nossa resistência, mas também onde nós estamos na história daqui para frente?, resume Camila Moreno, pesquisadora e coordenadora de sustentabilidade da ONG ecológica alemã Fundação Heinrich Böll, sobre um dos temas centrais que deverá ser discutido na Rio+20, conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável que será realizada entre 13 e 22 de junho no Rio de Janeiro.
O discurso oficial do governo brasileiro para a conferência e para o tema, via ministério das Relações Exteriores, é que a economia verde vai definir o debate sobre o desenvolvimento nos próximos 20 anos. Calcada em documentos da indústria do petróleo, a pesquisadora da ONG alemã é novamente mais direta, ?a economia verde é intrinsicamente dependente da economia marrom, da economia petroleira?.
?Eles estão operando com um horizonte que vai daqui até 2020, quando vai se definir uma nova arquitetura institucional e financeira tanto na ONU quanto em termos de marcos legais nos países; quanto também um período um pouco mais longo, até 2050, quando se imagina que vai estar realmente dada a transição para uma economia pós-petroleira?, afirmou Camila Moreno durante o seminário Outra economia, outro desenvolvimento, outra cooperação: A sociedade civil rumo à Rio+20/Cúpula dos Povos, realizado pela Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), quinta-feira (10), no Rio.
Para Moreno, o que está em jogo no horizonte é como o capitalismo vai viver para além dos combustíveis fósseis. Assim, a economia verde surgeria como alternativa para viabilizar não só a expansão da atual economia petroleira até seu limite, mas também o controle das novas fontes de energia pelas mesmíssimas empresas e grupos de poder que mandam no petróleo. ?Economia verde é fundamentalmente como vai se extrair mais recursos naturais e quem vai controlar esses recursos?, simplifica a pesquisadora.
Histórico do termo
Camila volta a 2005 rememorando como o termo economia verde começou a ?cair no colo? da população. ?A economia verde nasce quando é lançado um relatório da ONU sobre o impacto econômico das mudanças climáticas. Então são feitos planos de transição para uma economia de baixo-carbono e a principal medida de curto prazo é a aposta nos agrocombustíveis?, diz ela, não esquecendo de ressaltar no contexto do ?boom? dos agrocombustíveis a crise alimentar de 2008, anterior à crise financeira de 2009 e 2010. ?Só que a ideia de ?baixo?-carbono não colou depois de 2008, quando a ideia
de ?baixo?, ?pequeno? ou ?diminuir? era completamente ao contrário do senso de superação da crise. Então todos os textos de economia de ?baixo? carbono foram rebatizados para desenvolvimento verde, e daí ficou o verde?, completa.
Segundo a pesquisadora essa volta ao passado joga luz para se entender como é inseparável o debate de economia verde do debate de clima e energia. Para Camila, ?é através da política nacional de clima e dos planos de ação dos países que vai se introduzir a ideia de criação de mercado dos ativos ambientais, perdendo toda a construção política do que é a agroecologia e a disputa de sistemas?.
Precificação e propriedade
E esses mercados são a nova fronteira de acumulação do capitalismo. Como exemplo ela cita o próprio relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que define o ?estoque e o fluxo dos serviços ecossistêmicos? como ?constituição? do capital natural. ?Ou seja, o ?estoque e o fluxo de serviços ecossistêmicos? é a polinização das abelhas, a respiração das aves, a água e a fertilidade do solo?, traduz a pesquisadora, acrescentando que, ainda segundo o Pnuma, ?o erro da economia marrom é que até agora ainda não conseguiu dar valor (preço) a esses ativos?.
O enredo se dramatiza quando temos um contexto em que ?esses ativos?, os recursos naturais, estão cada vez mais escassos. Aí, salienta Camila, entra ?a velha e boa garantia de direitos de propriedade sobre esses ativos ambientais?. Ela alerta que no Brasil a questão está explicitada no novo Código Florestal, quando o capítulo 11 cria o Certificado de Cobertura de Reserva Ambiental e dá poderes aos proprietários de terra com excedentes de reserva legal a registrarem e negociarem essas ?sobras? em bolsas de valores, as futuras bolsas verdes.
Contra-ataque
Em um cenário de negociação de ?excedentes? ambientais o próximo passo torna-se o acúmulo desses ?excedentes?, ao mesmo tempo em que as superpopulações citadinas levam os países a serem obrigados a comprarem pacotes de eficiência energética, fechando o círculo acúmulo e venda de ?capital ambiental?. É aí que Camila Moreno aponta um dos remédios contra a economia verde. ?Temos que questionar essa visão de que a urbanização é um fato inexorável. O quão ideológico são esses dados que estão sendo construídos inclusive pelo IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, em inglês) que condenam o modo de vida rural e reforçam a lógica estrutural de esvaziar os territórios e levar todo mundo para as cadeias de consumo das cidades??.
texto original neste endereço: Carta Maior
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