Aspectos culturais no Enem
Geografia

Aspectos culturais no Enem



Eis aí mais uma constatação de que não basta apenas estar afiado com o conteúdo das matérias cobradas no Enem (ou em qualquer outro concurso) para se atingir um bom rendimento nos exames.

A prova de Ciências Humanas e suas Tecnologias (caderno azul) do primeiro dia do Exame Nacional do Ensino Médio de 2012 reproduziu em seu enunciado a capa do primeiro número da revista do Capitão América, lançada em março de 1941, nos Estados Unidos.

A imagem mostra o herói dos quadrinhos desferindo um direto de direita em, nada mais nada menos, Adolf Hitler, em meio a uma saraivada de disparos efetuadas por sanguinários nazistas.

A seguir, a indagação contra quem ou o quê os Estados Unidos estariam lutando no momento de surgimento do personagem Capitão América.

Observe.

Enem 2012 - Questão 4 - Prova Azul

Com sua entrada no universo dos gibis, o Capitão América chegaria para apaziguar a agonia, o autoritarismo militar e combater a tirania. Claro que, em tempos de guerra, um gibi de um herói com uma bandeira americana no peito aplicando um sopapo no Führer só poderia ganhar destaque, e o sucesso não demoraria muito a chegar. A capa da primeira edição norte-americana da revista demonstra sua associação com a participação dos Estados Unidos na luta contra:

(A) A Tríplice Aliança, na Primeira Guerra Mundial

(B) Os regimes totalitários, na Segunda Guerra Mundial

(C) O poder soviético, durante a Guerra Fria

(D) O movimento comunista, na Guerra do Vietnã

(E) O terrorismo internacional, após 11 de setembro de 2001

Esse é o tipo de questão que mostra o quanto o conhecimento não é uma coisa hermeticamente fechada, tema que já abordei quando escrevi um artigo para o portal InfoEnem sobre a importância de estar antenado, em que destacava o quanto é fundamental não só estar a par dos acontecimentos ligados à atualidade, mas também saber como contextualizá-los dentro da realidade da época ou mesmo de agora.

Da mesma forma, a música, o cinema e a literatura, entre as mais diversas manifestações culturais, lhe dão um embasamento teórico que vai muito além de determinadas grades curriculares que não dão a menor brecha para a liberdade de pensamento.

Em minhas provas, quando peço para que os alunos estabeleçam relações entre diferentes assuntos, no início eles imaginam que a minha intenção é intensificar o nível de dificuldade da pergunta. Depois que eles pegam a mecânica da coisa, a percepção de que  a coisa é mais simples do que se supunha surge de modo natural e espontâneo.

Sem querer desmerecer ninguém, se você é professor, certamente sabe muito bem sobre o que estou falando. O aluno que possui uma ampla bagagem cultural está um passo à frente dos demais. Ele tem a mente aberta e a visão aguçada para associar, sem o mínimo esforço, os diversos elementos que lhe são sugeridos.

Voltando à questão, é preciso compreender todo o contexto histórico que envolve não só as razões da criação do personagem, mas também o que significava para o mundo como um todo a ascensão e expansão do nazismo nas décadas de 1930 e 1940.

Não custa lembrar que, quando o gibi foi publicado, a Segunda Guerra Mundial transcorria com uma clara vantagem da Alemanha sobre os aliados. Enquanto o couro comia na Europa, os Estados Unidos (que só aderiram formalmente à guerra no final de 1941, após o ataque japonês a Pearl Harbor), desfrutavam de uma aparente tranquilidade, produziam em larga escala e se beneficiavam do distanciamento geográfico do maior conflito que o mundo já havia presenciado.

A figura de Hitler, à frente de um mapa estadunidense, representa uma clara ameaça de que, se o mal não fosse combatido, a democracia e o próprio estilo de vida tão cultuado pelos estadunidenses, o american way of life, correria um sério risco de sucumbir. E aí surge o paladino da justiça, com as cores da bandeira nacional, simbolizando a liberdade e derrotando as forças malignas de um regime cruel e totalitário.

Fonte: Jornal O Globo, 03/11/2012.





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