Geografia
Ainda sobre industrialização e exportação de commodities
Respondi a um comentário sobre o post Exportar commodities é bom negócio. E viva a privatização da Vale!, que merece ser destacado em um novo post. O comentário é muito interessante, pois foge desses lugares comuns nacionalistas e estatistas que povoam as ciências sociais e a política brasileira. Discordo das ideias expressas no comentário pelas razões que apresento abaixo, mas é certo que se trata de um comentário que reflete sobre a questão das políticas industriais de maneira ponderada e sem preconceitos ideológicos. Vamos a ele, então.
De fato, não tem sentido dizer que exportar commodities é mau negócio para um país, simplesmente porque não há duas alternativas, a de exportar commodities ou produtos industrializados. Os EUA são um país que exporta as duas coisas, e muito bem.
Mas, atenção! O que não se pode é desenvolver-se exclusivamente à base de commodities; basta ver que não há um só país desenvolvido que não tenha uma base industrial importante,a não ser produtores de petróleo. A Vale, por exemplo, queria atuar pela via comoda, exportando minério, sem beneficia-lo. Bom para ela, que evitava entrar em briga com muitos mais cachorros grandes, quando no minério só há um concorrente, que é a Austrália.
Mas o minério não é dela, mas do país, ale tem direito de lavra, e bem fez o governo em pressiona-la para montar uma siderúrgica, como de fato está montando.
O governo não deve interferir por poca coisa, mas acreditar que o que é bom para uma empresa sempre é bom para o país é um ato de fé indemonstrado, tanto quanto o inevitável caminho para o socialismo o é.
O interesse das empresas e dos países onde as empresas atuam converge na medida em que a elevação da produtividade do trabalho ocorrer no ritmo mais acelerado possível. Isso já está mais do que demonstrado, posto que os países desenvolvidos são aqueles cujas empresas exibem trajetórias de elevação rápida da produtividade. Nesse sentido, interesses de governos e de empresas não são sempre convergentes, mas, quando se trata da produtividade, que é o essencial, eles convergem, sim. Um estudo que demonstrou isso muito bem, já faz mais de 20 anos, foi a pesquisa internacional coordenada por Michael Porter, sintetizada no livro A vantagem competitiva das nações (Campus, 1993).
De outro lado, fica a pergunta: quem é que decide o que é "bom para o país" em se tratando do funcionamento de uma economia de mercado? Políticos e burocratas do governo? Isso já é questionável, mas sobretudo quando se trata de governos marcados pelo aparelhamento de estatais e até de agências reguladoras na base do mais rasteiro "toma lá, dá cá", prática cujas consequências nefastas para a eficiência da economia estão muito bem demonstradas no setor aeroportuário, na má administração dos correios e na perda de qualidade dos serviços de telefonia.
Além disso, acreditar que os burocratas de um governo sabem avaliar melhor do que empresários e administradores privados em quais atividades as empresas podem alcançar competitividade internacional é uma suposição que a história brasileira e internacional desautoriza completamente. Empresas exportadoras de commodities têm interesse em industrializar seus produtos quando estão aptas a fazer isso com eficiência comparável a dos competidores em potencial. Nesse sentido, o governo não tem nada que pressionar politicamente para que essa industrialização aconteça, pois, se a empresa puder fazer isso com produtividade elevada, ela o fará, já que é do seu interesse. E se o responsável por essa pressão política é um politiqueiro incompetente e autoritário como o Lula, então... aí é que temos razões para temer mesmo!
Em suma, devemos rezar para que a Vale não se saia mal nessa empreitada, mas, por todas as razões que apontei acima, os prognósticos são bem ruins.
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