O urânio empobrecido é um subproduto do processo do enriquecimento da forma natural desse elemento químico. Pelo fato de esse metal ser extremamente denso, resistente e inflamável, ele vem sendo amplamente empregado na área civil e militar. Seu uso crescente vem aumentando a dispersão de partículas de urânio empobrecido na natureza, expondo principalmente as populações civis a potenciais riscos cujo real impacto para a saúde humana e o meio ambiente ainda é obscuro e polêmico.
Há ainda a suspeita de que seu emprego em armamentos militares possa ser um modo silencioso de os países com altos estoques desse metal eliminarem resíduos tóxicos de seus territórios, depositando-os em locais atingidos por guerras, principalmente nos últimos 15 anos.
A utilização do urânio em sua forma natural data de 79 a.C., quando artesãos aplicavam esse metal na superfície de vidros e de cerâmicas, como um corante para obtenção de amarelo. Sua descoberta foi creditada ao químico alemão Martin Heinrich Klaproth (1743-1817), que o batizou urânio, em 1789, em homenagem à descoberta do planeta Urano, ocorrida oito anos antes. Posteriormente, o físico francês Antoine Becquerel (1852-1908) identificou as propriedades radioativas desse elemento.
Na década de 1940, as iniciativas do governo norte-americano visando ao desenvolvimento da primeira bomba atômica, através do Projeto Manhattan, inauguraram a era nuclear, em 15 de julho de 1945, no teste Trinity . Em 6 de agosto daquele ano, uma bomba de quatro toneladas, contendo cerca de 60 kg de urânio e batizada de Little Boy (Rapazinho), foi lançada sobre em Hiroshima (Japão), Três dias mais tarde, uma segunda bomba atômica cai sobre Nagasáki. Essas explosões causaram a morte instantânea, bem como nas décadas seguintes, pelos efeitos nocivos da radiação no organismo, de aproximadamente 200 mil pessoas. Desde então, o urânio passou a ser um elemento de importância estratégica no cenário político mundial, tanto sob o ponto de vista energético quanto militar.
Sobra empobrecida
O urânio é o elemento radioativo mais denso que ocorre na natureza. Sua concentração estimada na crosta terrestre está em torno de 4 miligramas por quilograma (mg/kg), podendo ser encontrado em vários tipos de solo. Apesar de sua alta densidade, o urânio não é raro, sendo mais abundante até que o tungstênio, mercúrio ou chumbo.
Embora considerado pouco radioativo, o urânio é um metal pesado com potencial quimiotóxico. Todos os seus isótopos (no caso, átomos de urânio que se diferenciam apenas pelo número de nêutrons no núcleo) emitem partículas alfa (formadas por dois prótons e dois nêutrons). Devido ao grande tamanho, as partículas alfa perdem rapidamente energia cinética, o que reduz seu poder de penetração. Assim, são incapazes de penetrar até as camadas superficiais da pele humana. Portanto, acredita-se que o urânio só ofereça risco à saúde humana se for absorvido por inalação e ingestão ou penetre os tecidos.
O urânio natural, encontrado na forma de minério, é composto por uma mistura de três isótopos distintos: o urânio 235 ( 235 U), o urânio 234 ( 234 U) e o urânio 238 ( 238 U), em que a concentração de cada um dos isótopos está diferentemente representada (respectivamente, cerca de 0,71%, 0,0054% e 99,28%). Devido à radioatividade, a quantidade de urânio em uma amostra diminui gradativamente ao longo do tempo, mas sua meia-vida (tempo necessário para a quantidade de urânio se reduzir à metade) é extremamente longa: cerca de 4,5 bilhões de anos para o 238 U.
Desses isótopos, apenas o 235 U é utilizado como combustível nos reatores de usinas nucleares, bem como na produção de energia e em armas nucleares, pelo fato de ser o único capaz de sofrer fissão nuclear (fragmentação do núcleo atômico) provocada por nêutrons lentos (pouco energéticos).
Como a proporção do 235 U é muito baixa no urânio natural, é preciso grandes quantidades deste último para se obter frações mínimas do primeiro. O urânio natural que sobra nesse processo de produção fica com um percentual de aproximadamente 0,3% de 235 U e passa a ser chamado urânio empobrecido.
Marcus Fernandes de Oliveira
Instituto de Bioquímica Médica,
Universidade Federal do Rio de Janeiro