O arquiteto José Fábio Calazans conta ter ficado surpreso com a tempestade de terça-feira (8), não com o alagamento da marginal Tietê. Estudioso do rio há 32 anos, ele diz: "Eu sabia que mais hora menos hora ia alagar. É como alguém que mora ao lado de um vulcão...". A pista alagou, segundo ele, porque a marginal não deveria existir. "A marginal é um erro. Ampliá-la é ampliar um erro." Ele propõe a construção de um parque linear de 90 km ao lado do rio, de Mogi das Cruzes a Itapevi, com lagos para abrigar a água de dias excepcionais, como anteontem. A marginal atual seria substituída por pistas paralelas distantes 1,5 km das que existem hoje. O projeto, que deve consumir 15 anos, visa integrar o rio à cidade. O diagnóstico de Calazans pode parecer radical, mas não é de uma voz isolada --três especialistas em urbanismo e drenagem ouvidos pela Folha concordam que a ampliação da marginal é um equívoco. "É um erro histórico", diz o arquiteto Vasco de Mello, que integra um grupo que questiona a obra do governador José Serra, orçada em R$ 1,3 bilhão. "As pistas vão ficar congestionadas em seis meses. Estão jogando dinheiro no ralo." O problema principal da obra não é tanto a impermeabilização do solo, na visão dos engenheiros Julio Cerqueira César Neto e Aluísio Canholi. A Nova Marginal deve aumentar em 19 hectares --ou cerca de 30 campos de futebol-- a impermeabilização do solo, de acordo com a Dersa. Segundo Canholi, essa área é desprezível quando comparada à impermeabilização da Grande SP, de 150 mil hectares. "Do ponto de vista da hidrologia, a Nova Marginal é pouco significativa", diz. A marginal alagou, segundo Canholi, porque a chuva foi excepcional. Medição feita pela equipe dele na ponte da Casa Verde constatou que a vazão do rio estava em 735 m3 por segundo às 16h de anteontem. Em setembro, o rio costuma correr à razão de 30 m3 por segundo, afirma. O problema da Nova Marginal é acentuar uma divisão que já existe entre o rio Tietê e a cidade, na visão do arquiteto Fernando Mello Franco, premiado na Bienal de Arquitetura de Roterdã com um projeto sobre piscinões e urbanismo. "A cidade precisa rever a sua relação com o rio. Pensar a partir do trânsito é uma forma antiga de pensar a cidade. Você isola o rio, isola os problemas, em vez de articulá-los. A Nova Marginal pegou a contramão da história." Segundo Mello Franco, o Tietê deveria ser um eixo metropolitano e para isso a cidade tem de chegar até o rio, como acontece com Londres, Paris, Viena e Lisboa. Para esse plano funcionar, segundo ele, é fundamental reduzir o fluxo de carros nas marginais. "Sou radicalmente contra a Nova Marginal porque ela vai contra um projeto do próprio governo, o Rodoanel. Os investimentos no Rodoanel eram para tirar carros da marginal." Outro problema da Nova Marginal, diz Mello Franco, é que não há um plano urbano que articule as novas pistas com o resto da cidade. "São Paulo sempre foi construída pensando na produção, não como valor de morada, como aconteceu com o Rio. A ampliação da marginal repete esse erro histórico", afirma. O engenheiro Cerqueira César Neto, que presidiu a agência da bacia do Alto Tietê entre 2002 e 2006 e é professor aposentado da Politécnica da USP, diz que o principal equívoco é a falta de articulação entre os 39 municípios da Grande SP. "Falta um plano global para o Tietê. Cada município faz o que quer. Essa obra [a Nova Marginal] é uma gambiarra." Outro lado A Dersa diz que as novas pistas da marginal Tietê vão suportar a demanda de trânsito "por um longo período". Segundo nota da assessoria, "não podemos analisar a marginal isoladamente. É preciso levar em consideração que a conclusão das obras vai coincidir com o término do trecho sul do Rodoanel e da duplicação da avenida Jacu-Pêssego". A empresa cita ainda o término do trecho norte do Rodoanel, previsto para 2014. Para a Dersa, não faz sentido a crítica segundo a qual a Nova Marginal seria uma obra sem articulação com o resto da cidade. "A Nova Marginal não é uma obra isolada. Faz parte de uma série de investimentos em transporte do governo estadual." Para a assessoria, ela foi submetida a audiências públicas, das quais participaram arquitetos e urbanistas. MARIO CESAR CARVALHO - Folha de S.Paulo- 10.09.09 Veja abaixo vídeo que comprova esta análise do Urbanista
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