?Lagos? Oceânicos
Geografia

?Lagos? Oceânicos


?Lagos? Oceânicos
?Ruído? sísmico em dados de prospecção de petróleo pode decifrar o processo de mistura dos oceanos
por Lucas Laursen
BERTA BIESCAS E VALENTÍ SALLARÈS, Unidade de Tecnologia Marítima. Conselho Nacional de Pesquisas da Espanha.

SOANDO BEM: com cerca de 80 km de diâmetro, um anel de água quente e salgada no Atlântico, conhecido como meddy, foi detectado recentemente, com o uso de dados de pesquisas sismológicas realizadas há 15 anos.

Há três décadas pesquisadores descobriram aquilo que são essencialmente enormes lagos de água salgada no oceano Atlântico. Esses ?lagos?, conhecidos em inglês como meddies, são lentes aquáticas em suave rotação, com até 100 km de diâmetro e 1 km de espessura. Eles fl utuam a algumas centenas de metros sob a superfície oceânica. Esses corpos grandes e cálidos, que, descobriu-se, vêm do mar Mediterrâneo, devem ter impacto sobre as trocas de calor no oceano ? e sobre o clima do planeta. Mas os esforços para estudar os meddies ? o que geralmente exige o emprego de sondas que medem diretamente a temperatura, salinidade e velocidade oceânicas ? se mostraram muito dispendiosos, incomuns e esparsos para revelar como os meddies dissipam calor.

Agora, pesquisadores demonstraram que uma ferramenta emprestada da indústria petrolífera é capaz de gerar instantâneos rápidos e de alta resolução dos meddies. A técnica, utilizada inicialmente para encontrar reservas de petróleo sob o assoalho oceânico, emprega reflexões sonoras. Equipamentos de prospecção em navios disparam jatos de ar logo abaixo da superfície aquática; as ondas acústicas se propagam até o fundo e são refletidas para uma rede de microfones que vai a reboque do barco. O tempo de retorno das ondas sonoras revela a densidade do material pelo qual passaram.

As regiões de fronteira entre massas aquáticas também têm uma ?assinatura? sonora, muito fraca, que a indústria petrolífera costumava tratar como simples ruído. Mas, em 2003, uma equipe liderada por W. Steven Holbrook, da University of Wyoming, nos Estados Unidos, adotou a técnica e criou imagens inesperadamente nítidas das fronteiras de densidade no oceano. Mudanças na densidade da água do mar resultam de mudanças de sua temperatura e salinidade. Como essas grandezas costumam ter valores específicos para cada corrente oceânica, os pesquisadores conseguiram visualizar interações entre frentes oceânicas, da mesma maneira que os climatologistas mapeiam as fronteiras entre regiões climáticas.

Desde então cientistas analisaram dados de antigas pesquisas da indústria petrolífera e improvisaram alguns experimentos que pegaram carona em expedições oceanográficas e petrolíferas. Utilizando dados de uma pesquisa sismológica da costa sudoeste da Espanha, realizada em 1993, uma equipe liderada por Valentí Sallarès, da Unidade de Tecnologia Marítima do Conselho Nacional de Pesquisas da Espanha, em Barcelona, relatou, na edição de 14 de junho da revista Geophysical Research Letters, que conseguiu capturar imagens com detalhes nunca antes vistos de três meddies.

As imagens sismológicas de Sallarès revelam ?dedos salinos? e outras características da mistura entre as águas, com dimensões de até 10 m. ?A princípio é muito instigante conseguir ver coisas desse tipo?, diz Raymond Schmitt, um oceanógrafo do Instituto Oceanográfico Woods Hole, nos Estados Unidos. Mas Schmitt diz que ele e seus colaboradores ainda estão tentando entender como interpretar imagens sismológicas de meddies e outras regiões de mistura oceânica, como ondas subaquáticas e fronteiras entre correntes.

Perfis sismológicos ainda não são amplamente utilizados na comunidade oceanográfica, em parte porque ninguém publicou uma fórmula quantitativa confiável para converter medidas sísmicas em grandezas oceanográficas tradicionais. A sismologia detecta reflexões originadas em locais onde a velocidade do som se altera. Sondas oceanográficas medem as condições aquáticas diretamente. Sallarès espera unificar os dois tipos de dados: ?O primeiro passo foram as imagens, mas, se não formos capazes de quantificar os processos de mistura, não teremos conseguido coisa alguma?.

Sallarès avalia que os resultados preliminares de uma recente expedição oceanográfica sismológica sugerem que os valores de temperatura e salinidade podem ser mais difíceis de estabelecer que originalmente se imaginou. Holbrook, que liderou sua própria expedição oceanográfica sismológica no litoral de Costa Rica, em abril, escreveu, do navio, que a oceanografia sismológica precisa ?gerar resultados quantitativos interessantes e úteis?, de modo que os oceanógrafos possam encará-la como ?um acréscimo crucial a seu arsenal de técnicas, e não uma mera curiosidade?.

Ninguém sabe exatamente em que os meddies contribuem para a mistura no Atlântico, mas Sallarès diz que os perfis sismológicos ?são um claro primeiro olhar, mais preciso do que os dados oceanográficos podem nos dar?.

Um Mar Quente e Salgado
O relativo isolamento do mar Mediterrâneo e seu clima ensolarado, o tornam propenso à evaporação rápida. Como resultado disso ele é muito mais salgado que o oceano Atlântico. Águas mediterrâneas penetram no Atlântico na forma de meddies, massas aquáticas que apresentam uma suave rotação, e possuem diâmetros de até 100 km e espessuras de 1 km. Os meddies carregam seu sal e calor para o mar aberto, de modo que suas fronteiras são vistas de modo particularmente intenso em imagens sísmicas.

Scientific American Brasil





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